Diário do Alentejo

Ruptura da fidelização: nova lei, nova razão
Opinião

Ruptura da fidelização: nova lei, nova razão

Mário Frota | presidente emérito da Associação Portuguesa de Direito ao Consumo e presidente do Instituto Luso-Brasileiro de Direito do Consumo

24 de setembro 2022 - 17:00

A Lei das Comunicações Electrónicas publicada no Jornal Oficial a 16 de Agosto pretérito entra em vigor a 14 de Novembro p.º f.º Há novas regras no capítulo da ruptura da denominada fidelização: sem que pelo facto o consumidor deva eventual compensação ao fornecedor por não chegar o contrato ao seu termo normal (6, 12 ou 24 meses, consoante os casos).

 SITUAÇÕES DE ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS TIPIFICADAS NA LEI

A lei estabelece expressamente as hipóteses em que é lícito ao consumidor romper o contrato sem nada ter de pagar à empresa. A empresa não pode exigir do titular o pagamento de quaisquer encargos pelo incumprimento do período de duração do contrato se ocorrer:

  • Alteração da residência permanente, se a empresa não puder assegurar a prestação do serviço contratado ou equivalente, em particular em termos de características e de preço, no novo domicílio;
  • Mudança imprevisível da residência permanente para país terceiro;
  •  Situação de desemprego por despedimento promovido pelo dador de trabalho e por facto não imputável ao trabalhador [que implique perda do seu rendimento mensal disponível];
  •  Incapacidade permanente ou temporária para o trabalho, de duração superior a 60 dias, nomeadamente em caso de doença, que implique, pois, perda do rendimento mensal disponível

 

O exercício do direito de resolução [ou seja, o de pôr termo ao contrato] deve fazer-se por meio de comunicação escrita, por correio electrónico, com a antecedência mínima de 30 dias, e a junção de elementoscomprovativos, como segue:

  • Alteração do local de residência - documento que o comprove;
  • Mudança imprevisível para o estrangeiro - certificado de residência no país de destino ou cópia de contrato de trabalho ou equivalente, comprovativo da mudança;
  • Situação de desemprego - declaração comprovativa da situação, emitida pelo Centro de Emprego ou pela Segurança Social.
  • Quebra de rendimentos correspondente a uma redução igual ou superior a 20 % - calculada por comparação entre a soma dos rendimentos do trabalhador no mês em que ocorre a causa determinante da correspondente alteração e os auferidos no mês anterior.

Consideram-se relevantes para cálculo da quebra de rendimentos:

  • Trabalho dependente - o valor mensal bruto;
  • Trabalho independente – facturação mensal bruta;
  • Pensões - o valor mensal bruto;
  • O valor mensal de prestações sociais recebidas de forma regular;
  • Os valores de outros rendimentos recebidos de forma regular ou periódica.

 

A perda do rendimento mensal disponível [no que se refere a pensões e a prestações sociais percebidas de forma regular] comprovar- se-á através de documentos que permitam a verificação de tais factos, entre outros, de:

  • Entidade patronal;
  • Centro de emprego ou da competente autarquia;
  • Instituição bancária com reflexo da situação financeira do titular.

 

ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS PELOS MAIS FACTOS IMPREVISÍVEIS

O anteriormente disposto não prejudica a aplicação do regime de resolução por alteração das circunstâncias previsto no Código Civil. Eis o que ali estabelece o n.º 1 do seu artigo 437:

 

Se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato […] desde que a exigência das obrigações por ela assumidas afecte gravemente o princípio da boa-fé e não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato.”

 

Por conseguinte, nestas circunstâncias pode lançar-se mão de um tal dispositivo para se pôr termo ao contrato sem ter de, em princípio, compensar a empresa por tal ruptura, à semelhança do que ocorre nas situações ora expressamente enunciadas na lei.

A Lei Antiga não previa em pormenor tais situações, mas era possível lá chegar através do recurso genérico à disposição supra transcrita, como ocorreu tantas vezes, a despeito da resistência das empresas por ganância ou ignorância dos seus responsáveis (!), fosse qual fosse o escalão de onde promanavam.

 

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

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