Diário do Alentejo

Chegar à lua
Opinião

Chegar à lua

Vítor Encarnação, professor

23 de agosto 2022 - 14:00

O mundo existe todo dentro da nossa cabeça e a liberdade somos nós a mandarmos no nosso pensamento, dizia-me o meu avô. Pediu-me para fechar os olhos, às vezes os olhos fechados veem melhor, o escuro permite imaginar, a claridade e a realidade obrigam-nos a ver o que elas querem que vejamos, deu-me a mão, que me encostasse ao seu peito e sonhasse. E eu sonhei. Avô, eu já me sinto preparado para irmos à lua. Primeiro vamos olhar os dois para cima, depois pomos um bocadinho de memória na cabeça e alma no corpo, é melhor mais do que menos, depois tu metes os teus microscópios e as tuas lupas no bolso para o caso de nos perdermos, depois levamos uma boa dose de coragem se por acaso sentirmos medo, depois guardamos num talego de pano amêndoas e figos secos e quatro ou cinco fatias de ovo para quando tivermos fome, não nos temos de preocupar com a felicidade, a paz e a liberdade porque elas estão sempre dentro de nós, depois dizemos que nos vamos deitar, depois saímos pela porta do quintal, depois levamos um pássaro para escrevermos no céu, depois levamos uma borboleta com um futuro longo, depois saímos da nossa rua e das outras ruas todas da aldeia, depois subimos a uma árvore, depois a uma nuvem, depois a um trovão, depois a um relâmpago, depois subimos umas escadas feitas de estrelas, depois tu és da minha idade e eu sou da tua, depois chegamos à lua. Avô, daqui de cima eu vejo melhor a tua alma.

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