A invasão da Ucrânia pela Rússia, a que temos estado a assistir, pode parecer, à primeira vista, surpreendente, mas, à luz das teorias da geoestratégia não o será tanto. SO almirante francês e grande estudioso destas matérias, Raoul Castex (1878 – 1968) teorizou que, na Europa, surge, ciclicamente, o que ele chamou um “perturbador continental”. Isto é, surge uma nação expansionista, forte em terra, que faz desencadear uma guerra.
Segundo ele, contra esse perturbador continental, e para o derrotar, será necessário que se levantem alianças de outras nações, e aí será o poder marítimo que fará pender balança em desfavor do perturbador continental.
Dá vários exemplos históricos: a Espanha de Carlos V e Filipe II (no século XVI), a França de Luís XIV (no século XVII), a França de Napoleão (no século XIX), a Alemanha de Guilherme II e, depois, de Hitler (no século XX), que perturbaram o continente europeu com guerras expansionistas. E, na realidade, foram derrotados por alianças marítimas. Preponderando nelas a Inglaterra e o Estados Unidos da América.
Castex, nos seus escritos, previra que o próximo ‘perturbador continental’ seria a União Soviética. Não se enganou por aí além, como estamos a ver!
Já o alemão Friedrich Ratzel (1844 – 1904), notabilizou-se na geopolítica, nomeadamente pela teorização do conceito de ‘espaço vital’.
Segundo ele, para cada povo, há um espaço necessário para realizar as suas caraterísticas e aptidões próprias, e, em função disso, esse povo tem um direito natural a ocupar e usar esse espaço territorial, por ser o seu espaço vital.
Esta foi a base teórica da Alemanha nazi para a sua aventura expansionista continental, largamente expendida no “Mein Kampf”, o livro de Adolf Hitler.
Ora, a argumentação que vem do lado da Rússia de Vladimir Putin, para fazer a guerra e invadir o território da Ucrânia, aliás, na sequência de outras anexações territoriais que já veio fazendo nos últimos anos, é a de que a Ucrânia faz parte do seu espaço vital.
Num discurso de 22 de fevereiro de 2022, disse Putin: “a Ucrânia, para nós, não é apenas um país vizinho. É parte integrante da nossa própria história, cultura, espaço espiritual.”. Do mesmo modo que tem acrescentado referências a um direito de segurança que o leva a não querer permitir, às nações vizinhas, livres opções políticas.
Putin, assim, entende que tem um direito natural a ocupar e controlar esse território, sobrepondo esse seu determinismo ao direito do povo ucraniano a decidir livremente as suas opções e o seu destino.
A única possível oposição ao perturbador continental do século XXI parece ser a aliança de nações democráticas, defensiva, que é a NATO (Organização do Tratado do Atlântico Norte).
Justamente uma potência marítima.