Diário do Alentejo

Guerra
Opinião

Guerra

Vítor Encarnação, professor

14 de março 2022 - 15:35

Na minha rua não há guerra, na minha rua não se ouvem bombas nem sirenes, ninguém chora, ninguém foge, nenhuma casa fica em ruínas, as famílias não se separam, os velhos não ficam para trás, as crianças não se agarram com medo a ursos de peluche no chão dos abrigos, os homens não têm de morrer para defenderem a minha rua. Mas a minha rua que parece que fica longe da guerra não fica longe da guerra, a guerra é já ali, fica dentro do coração da maldade, quase que a ouço daqui, quase que a vejo daqui, a guerra não é um lugar, a guerra não é um tempo, a guerra é, tragicamente, uma coisa ruim que algumas pessoas trazem dentro delas e que às vezes apenas amaina, mas o ódio prevalece, o ódio é um bicho feito de ferro. Dentro da televisão, enquanto almoçamos e fazemos planos para a tarde ou para depois de jantar, a guerra parece um filme, uma série por episódios, condoemo-nos nesse entretanto, imaginamos a aflição de termos de deixar a nossa casa de repente, os nossos filhos, os nossos pais, o nosso conforto, a vida toda, deitamos uma lágrima e dizemos que tristeza tão grande e rezamos e pegamos na bandeira dos que sofrem e fazemos donativos, fazemos o que podemos, felizmente a guerra é lá longe, esperemos que nunca seja na nossa rua, mas dentro de nós há medo porque sabemos que a guerra é apenas o exercício do ódio. E onde há ideologias extremadas costuma haver ódio e o ódio não escolhe ruas.

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