Sei onde fica a raiz do silêncio, a nascente da quietude, a fonte da luz, a porta para chegar ao céu, o princípio da lonjura, o fim do horizonte sem fim, o contentamento dos olhos, o repasto dos sentidos. Sei onde encontrar esta confluência de sensações, está tudo no mesmo sítio, ao mesmo tempo, garanto-vos que não é um sonho, não é uma ilusão, não é mentira, há chão para lá chegar, até lá é um Salto, lá chega-se calcorreando caminho, avistando abetardas e perdizes e sisões e vacas e borregos e tratores e homens da cor da terra e casas brancas encostadas umas às outras por causa da solidão, casas brancas sozinhas por causa da solidão, restolho de um lado e do outro, pedras de cal, há poucas horas que lá fui, tive pressa de vos contar, não me sentia bem se ficasse com esta dádiva só para mim, se fosse primavera falar-vos- ia de flores de um lado e do outro, ou de geadas se fosse inverno, a terra plana empina-se, ergue-se, sobe até ao altar dos céus, lugar de tocar no firmamento e na terra ao mesmo tempo, a ermida em Castro Verde, o adro em Mértola, apenas três passos de procissão, o povo rogando por chuva, a Virgem a garantir um bom ano agrícola, os nossos olhos voando, poisando nas suas seis capelas irmãs, poisando em planuras e serras, poisando em pássaros, poisando em nuvens, poisando em Deus se nele acreditarmos. De Aracelis avista-se tudo, se alguma coisa faltar é porque falta dentro de nós.