Não é preciso procurar muito para se encontrarem exemplos de como a teia burocrática que mina a economia do País pode comprometer a execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), a célebre “bazuca” europeia. Portugal prepara-se para receber 16.600 milhões de euros, entre subvenções (13.900 milhões) e empréstimos (2.700 milhões), dos quais a tranche inicial será de 2.100 milhões de euros. É muito dinheiro. A que se soma a execução do que resta do atual quadro comunitário de apoio, o Portugal 2020 (cuja taxa de execução no Alentejo está abaixo dos 50 por cento), além das verbas do Portugal 2030, cuja primeira versão será entregue aos parceiros sociais no próximo mês de setembro. Com as taxas de juro do financiamento do Estado português a baterem mínimos históricos (0,145 por cento para empréstimos a 10 anos), a verdade é que será difícil encontrar na história recente uma conjuntura tão favorável para a modernização do País, para a convergência dos indicadores sociais e económicos com a média europeia, para a redução das assimetrias internas, para combater as alterações climáticas e para o desenvolvimento das regiões do interior. É todo um ciclo que pode ser ameaçado pela burocracia endémica da Administração Pública portuguesa, como reconhece o presidente da Comissão de Acompanhamento do PRR, António Costa Silva: “Estou convicto que se nós adotarmos o mesmo modelo [do passado], se demorarmos oito, 10, 15 meses a responder aos projetos que são apresentados, se não simplificarmos o licenciamento, se a carga burocrática, que hoje existe, ainda for acrescida, não vamos conseguir executar este plano”. Como já aqui sublinhei, não é preciso procurar muito para se encontrarem exemplos concretos dessa teia imensa de “pergunta agora e pergunta a seguir” que emperra os processos, fazendo-os arrastar anos e anos. Não é preciso procurar muito, nem muito longe, basta olhar para o Baixo Alentejo. Primeiro exemplo: em fevereiro de 2019 foi lançado o primeiro concurso (no valor de 4,9 milhões de euros) para a construção do novo tribunal de Beja, que ficou deserto. Em setembro de 2020 foi lançado um segundo concurso (5,6 milhões), tendo surgido seis propostas, todas elas rejeitadas pelo júri pois umas estavam incompletas e outras apresentavam um valor superior ao valor base admitido. O terceiro concurso (6,1 milhões) foi aberto em abril deste ano. Passaram-se dois anos e não há sequer previsão de quando é que poderão começar as obras. Como não há previsão para o início das obras no Museu Regional de Beja. Sob tutela da Direção Regional de Cultura do Alentejo desde 2019, o Museu precisa de obras orçadas em 1,5 milhões de euros. Houve um primeiro concurso, em janeiro deste ano, anulado porque as empresas concorrentes apresentaram valores superiores. E um segundo, que está ainda a decorrer. Queixando-se a diretora regional de toda a “complexidade e morosidade inerentes” ao respeito integral do Código de Contratação Pública. A agilização dos procedimentos é crucial e não é incompatível com o necessário reforço da fiscalização da correta aplicação dos dinheiros públicos.