Diário do Alentejo

Caminhar na Verdade
Opinião

Caminhar na Verdade

Manuel António do Rosário, padre

04 de maio 2021 - 16:00

Este tema, fonte quase inesgotável, com algumas nuances, já mereceu anteriores reflexões minhas, nas páginas do “Diário do Alentejo”. Hoje, porém, centrar-me-ei na relação entre Ser e Parecer, partindo da análise de dois textos dos Evangelhos.

 

Durante a Quaresma, lê-se um episódio intitulado: “As tentações de Jesus” (Mt 4,1-11; Mc 1,12-13; Lc 4,1-13), que são também as nossas, e uma delas chama-se: Parecer.

 

Em S. João, há um outro trecho curioso: o encontro de Jesus com Natanael. No desenrolar do diálogo entre ambos, Jesus afirma: “Aqui está um verdadeiro israelita, no qual não existe fingimento” (Jo 1,47).

 

A mensagem de ambos os textos acaba por ser complementar: o primeiro diz-nos que há uma tentação que bate à nossa porta – a aparência; o segundo, afirma que a sua superação passa pela transparência e verdade.

 

À partida deveria haver coincidência entre Ser e Parecer; mas nem sempre isso sucede, e é frequente a conflitualidade, para além dos casos do foro psiquiátrico, que merecem uma abordagem específica.

 

Como cristão penso que a fé, na medida em que nos torna mais conscientes das nossas imperfeições e pecados, nos convida a ser humildes, simples, coerentes. Para que isso se torne realidade, é preciso viver em permanente estado de conversão, assumindo a condição de pecador, e não procurando justificar-se.

 

A conversão é, pois, convite à coerência, e, para ser eficaz, deve começar por dentro. A “Bíblia” utiliza, aliás, uma expressão muito bela: “mudança do coração”, a qual, em sentido bíblico, é sinal da identidade mais profunda da pessoa, da sua consciência. Com efeito, enquanto as mudanças exteriores, por serem superficiais, plásticas e transitórias, não criam raízes, as interiores, pelo contrário, geram comunhão entre o que somos e revelamos; tornam-nos mais naturais, livres e despretensiosos; e libertam-nos de temores, incertezas e oscilações comportamentais.

 

Este processo dá muito mais trabalho, é para toda a vida, mas vale a pena.

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