Diário do Alentejo

Portadores de doença rara prioritários na vacinação
Opinião

Portadores de doença rara prioritários na vacinação

Luís Brito Avô, médico

08 de abril 2021 - 17:10

A doença rara é aquela que tem uma incidência de um caso em cada duas mil pessoas. Estão identificadas cerca de sete mil doenças (80 por cento das quais têm caráter genético), existe capacidade de confirmação diagnóstica laboratorial precisa para cerca de 3 600 e terapêutica específica para 10 por cento das entidades.

 

Existem 300 milhões de pessoas no mundo com estas doenças e estima-se que em Portugal existam cerca de 800 mil pessoas portadoras destas patologias. A carga epidemiológica destas doenças constitui um problema sério para a saúde pública. De elevada complexidade, e muitas vezes incapacitantes, são um desafio assistencial e para as ciências biomédicas com necessidades ainda não atingidas a vários níveis.

 

Do ponto de vista sanitário, a espinha dorsal assistencial assenta no estabelecimento de uma rede de referenciação eficaz e da consolidação de centros de referência que prestem cuidados diferenciados, de elevada especialização, dispensa de medicamentos órfãos, capacidade formativa específica de profissionais de saúde, organização de registos e Investigação médica, e integração em redes de conhecimento europeias.

 

Na outra face desta estratégia estão os cuidados de proximidade, a articulação adequada com os cuidados primários, o desenvolvimento da hospitalização e terapêuticas domiciliárias, a prestação de cuidados continuados apropriados a estas patologias.

 

Os apoios ao cuidador, o empoderamento do doente no processo da decisão clínico-terapêutica e a literacia sanitária da população, a colaboração do doente na investigação clínica e farmacológica são áreas em que as associações de doentes desempenham um papel fundamental, sendo fulcral o seu empenho em todo o processo assistencial.

 

Foi estabelecido pela Comissão Europeia que até 2020 se conseguissem testes de diagnóstico para grande parte das doenças raras conhecidas – atualmente já possível para cerca de 3 600 e terapêutica específica para 200 doenças raras – objetivos que foram atingidos. Até 2027 pretende-se o diagnóstico no espaço de um ano para a totalidade das doenças raras que estiverem descritas e terapêuticas para cerca de mil.

 

Considerando-se a saúde como um estado de pleno bem-estar para além da ausência de doença, as políticas de apoio social, quer nos suportes económicos, integração socioprofissional e emprego, quer no reconhecimento do estatuto de cuidador informal, são pedras basilares na estratégia de apoio a doentes e famílias. É também fundamental atender a necessidades de integração escolar e ensino especial, assim como de ocupação de tempos livres, particularmente para as camadas mais jovens.

 

Numa época de pandemia, em que o acesso aos cuidados de saúde atravessa dificuldades, verificaram-se atrasos nas consultas, procedimentos, exames complementares e até na dispensa de terapêuticas. Foi necessário readaptar a orgânica de hospitais de dia e recurso à telemedicina para repor eficácia na prestação de cuidados. Por isso, recomenda-se que os portadores de doença rara com deficiência significativa sejam considerados grupo prioritário para a vacinação em curso.

 

Numa época de evolução das ciências biomédicas, em que a medicina de precisão, personalizada, centrada no doente em todas as suas vertentes biopsicossociais, em que a relação entre médico e doente, associada a uma extraordinária evolução tecnológica da intervenção biomédica, volta a ser pedra angular no sucesso dos cuidados de saúde, a posição da medicina interna gestora do doente e da utilização criteriosa dos meios complementares e terapêuticos detém enorme responsabilidade na prestação dos cuidados de saúde, incluído na área das doenças raras.

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