Diário do Alentejo

Aulas
Opinião

Aulas

Luís Godinho, jornalista

26 de março 2021 - 12:00

Uma nota pessoal: a minha filha mais nova tem 14 anos (agora feitos) e é aluna do 8.º ano (frequenta pois o 3.º ciclo do ensino básico). A 12 de março do ano passado, tinha o país 59 casos de covid-19 e o Alentejo nenhum, ficou sem aulas presenciais pois o Governo determinou nessa data o encerramento de todas as atividades letivas, em todos os graus de ensino. “Esta é uma luta pela nossa própria sobrevivência, pela proteção da saúde dos portugueses”, justificou o primeiro-ministro. E os miúdos foram mandados para casa com a indicação de que a medida seria reavaliada daí a aproximadamente um mês, i.e., no final da primeira semana de abril. Socorro-mo do arquivo do “Público” para recordar a decisão tomada nesse dia 9 de abril: “Só 250 mil alunos poderão ainda voltar às escolas”. E explicava o jornal: “A decisão anunciada pelo Governo prevê que só os alunos do 11.º e 12.º anos possam ainda retomar as atividades presenciais. São também estes que farão os exames nacionais, agora adiados para julho”. E assim foi, de facto. Os alunos do 11.º e do 12.º anos, bem como os estudantes universitários, lá voltaram às aulas presenciais. A minha filha mais nova, bem como centenas de milhares de crianças em circunstâncias idênticas, lá continuaram por casa entretidas com a telescola e com umas aulas ‘online’, garantidamente mais virtuais do que reais. As notas de final de ano, como habitualmente, foram positivas. Férias merecidas. Chegamos a setembro e já se contabilizam seis meses sem escola, escola a sério, nem convívio (também fundamental) com os colegas de turma. A abertura do novo ano letivo foi uma festa, ainda que com máscara e algum distanciamento social, e o primeiro período (três meses bem contados entre 17 de setembro e 18 de dezembro) decorre com a normalidade possível, ou o novo normal como agora se diz, sem a existência de focos significativos de contágio. Chegam as férias de Natal e o desenrolar da história é conhecido: crescimento exponencial do número de novos casos, de mortes e de doentes internados e em cuidados intensivos, necessidade de “fechar” o país. As escolas, num primeiro momento, ainda iriam permanecer abertas. Três dias depois são encerradas. “Manda o princípio da precaução que procedamos à interrupção de todas as atividades letivas durante os próximos 15 dias”, anunciou o primeiro-ministro a 21 de janeiro. Passaram-se duas semanas; depois um mês. Sabe-se agora que, se tudo correr como previsto, os alunos do 3.º ciclo do ensino básico regressão à escola no dia 5 de abril. Em mais de um ano, estas centenas de milhares de alunos tiveram três meses de aulas presenciais. É um absurdo! Um absurdo tanto maior quanto em concelhos como Alvito, por exemplo, a incidência cumulativa de casos a 14 dias é de 0 (zero). E, mesmo sendo de 0 (zero), aplica-se a mesma receita que em concelhos onde o número de casos é muito superior. O encerramento prolongado de escolas, lembra a Organização Mundial de Saúde, “interrompe serviços escolares essenciais, como imunização, alimentação escolar, saúde mental e apoio psicossocial” e pode provocar ‘stress’ e ansiedade nas crianças, devido à “perda de interação com os colegas” e à interrupção das rotinas. Não basta reabrir as escolas. É preciso recuperar o ano perdido.

Comentários