Diário do Alentejo

Vilanova
Opinião

Vilanova

José Saúde, jornalista

25 de janeiro 2021 - 12:30

A diáspora do tempo diz-nos que Fernando Pessoa deixou uma obra excelsa e subscrita em citações poéticas, que ficarão eternizadas para a posteridade. Expressava, numa das suas menções, que “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”. Somos contemporâneos de um tempo onde a trilogia mencionada nos enquadra como meros interlocutores desportivos, ficando a certeza de que jamais mergulhámos em obscuros lamaçais e nem tão-pouco num silvado onde se dogmatizavam ódios.

 

Fomos jovens que nascemos com aptidões e que conduziram os mais ajustados para o mundo do futebol. Retomo a ética daquela inesquecível personalidade literária e digo que Deus quis que sonhássemos, sendo que alguns dos nossos companheiros deixaram obra, enquanto outros ficaram-se pela rama de um sucesso que miravam como um lícito sonho. A mocidade, desses tempos, fazia da prática desportiva o motivo prioritário para expor os seus talentos na arte da bola.

 

É compreensível que nem todos usufruíram da possibilidade de acompanharem condiscípulos onde os talentos imperavam, logo, para os menos dotados era bola para a frente e fé em Deus. Relaciono este texto a um rapaz que veio ao mundo dos mortais em Grândola, a 22 de setembro de 1949, ficando assente na certidão de nascimento que o seu nome era, e é, Carlos Manuel Reis Vilanova.

 

O Vilanova foi um excelente jogador de futebol com o qual me cruzei nos escalões de formação do Sporting Clube de Portugal, ele como júnior, eu como juvenil. Todavia, tive o prazer, aquando da minha chegada a Alvalade, de treinar com a equipa de juniores orientada por Mário Lino. Recordo, que naquela época de 1967/68, o Sporting, no escalão de juniores, apresentava, normalmente, o seguinte 11 na competição oficial: Vítor Manuel; Xico Palma, Bastos, Quito e Luís Guerreiro; Vieira, Jorge Leitão e Faustino; Armando Luís, Veiga, Vilanova e Abreu.

 

O evoluir da vida impôs-nos que trilhássemos caminhos diametralmente diferentes. O Vilanova, após a saída do Sporting, fez o percurso sénior no Sacavenense, Vitória de Guimarães, Marinhense, Juventude de Évora, Elvas, Desportivo Grandolense e Sport Club Grandolense, seguindo-se uma passagem, como treinador, no Desportivo Grandolense. Recentemente, o meu camarada ranger Chainho (fomos instruendos do primeiro curso de 1973 em Penude/Lamego) telefonou e deu-me a conhecer que o Vilanova se encontrava internado no hospital do Alentejo Litoral, em Santiago do Cacém, onde foi sujeito a uma operação à coluna.

 

É óbvio que a quem conheceu o antigo craque pareça intolerável tão estranha ocorrência. Vilanova, meu velho amigo e grandolense de alma e coração, termino a narrativa parafraseando Zeca Afonso numa das suas canções que serviu de senha para libertar Portugal das amarras do Estado Novo, e que proporcionou a Revolução dos Cravos, o 25 Abril de 1974: “Grândola, Vila Morena/ Terra da fraternidade/ O povo é quem mais ordena,/ Dentro de ti, ó cidade”. Força! A tua deslumbrante Grândola requer-te de volta.

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