Escrevi aqui, na passada semana, que um dos graves problemas do país não se prende com a falta de médicos - desse ponto de vista, com 515 médicos por 100 mil habitantes, Portugal está acima da média europeia, só ficando atrás da Grécia e da Áustria - mas com a sua desigual distribuição no território, havendo regiões (no litoral) com grande concentração de profissionais e outras (no interior) com graves carências, sobretudo nalgumas especialidades. No Baixo Alentejo sabemos bem o que isso significa, da falta de médicos de família ao encerramento da urgência da maternidade, passando pelos concursos para contratação a que ninguém concorre - no último ano, por exemplo, na Administração Regional de Saúde do Alentejo foram disponibilizadas 129 vagas, entre especialidades hospitalares, saúde pública e medicina geral e familiar, mas apenas 20 médicos ficaram na região.
Na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (Ulsba) ficaram por preencher vagas de ginecologia/obstetrícia, cirurgia geral, medicina interna, cardiologia, anestesiologia, gastroenterologia e radiologia. É um problema para o qual, aqui no "DA", temos vindo a chamar a atenção de forma sistemática. Faltam profissionais de saúde: o quadro de pessoal da Ulsba prevê a existência de 228 médicos, dos quais só cerca de 150 (menos de 70 por cento) estão efetivamente contratados, sendo por isso necessário recorrer a prestadores de serviços.
O número de médicos de família é insuficiente, havendo cerca de 14 mil pessoas sem acompanhamento clínico no distrito de Beja e no Alentejo Litoral; das 18 vagas abertas este ano apenas uma foi preenchida. A idade dos médicos que aqui prestam serviço é cada vez mais elevada e muitos aproximam-se da reforma, o que coloca ainda mais pressão sobre os serviços. Segundo Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, em Beja "mais de 70 por cento dos médicos tem mais de 62 anos".
Não havendo, estatisticamente, falta de médicos no país, falta seguramente "liderança e organização", para utilizar a expressão de Jaime C. Branco, diretor da Nova Medical School. Falta liderança e organização para que nestes territórios do interior exista uma resposta adequada aos problemas de saúde das populações. Acompanho por isso a generalidade das preocupações expressas pelo deputado João Dias, do PCP, designadamente quando propõe o alargamento do atual regime de incentivos à fixação de médicos nas regiões mais carenciadas, e a aplicação do regime de incentivos aos recém-especialistas que realizaram o internato médico numa vaga preferencial e que optem por exercer funções no estabelecimento ou serviço onde se verificou a necessidade.
No entanto, continuo convencido que a melhor forma de resolver, de vez, o problema é enfrentando-o com dureza. Não é aceitável que um jovem médico, depois de uma formação universitária que custou aos contribuintes entre 300 e 500 mil euros, opte por ir trabalhar para o privado ou recuse ser colocado (ainda que por um período de tempo limitado) nas regiões onde faz mais falta.