O meu animal de estimação preferido é o bode expiatório, dizia o homem muito empertigado na esplanada. Eu ando a fazer criação de bodes expiatórios há já muito tempo, sou dono de várias estirpes e linhagens, desde muito novo que descobri as inúmeras vantagens destes espécimes na gestão do meu dia a dia. Tenho tido tanto sucesso com eles que já tenho um rebanho, dezenas de bichos de duas patas à minha mercê, fracas cabeças, escravos da minha opinião e da minha análise, vítimas da minha boçalidade e da minha vanidade, guardo-os para situações muito específicas, para aqueles momentos em que me desobrigo de responsabilidades, para aquelas alturas em que necessito de passar as culpas, para aquelas situações em que descubro as minhas limitações e as minhas fragilidades e as transformo em petulância. É nestas precisas circunstâncias que eu arranjo um bode, vou ao sítio escuro e sujo onde os guardo e trago um para expiar a minha falta, aponto-lhe o dedo, ataco-o, faço sangrá-lo, sacrifico-o para que eu me mantenha puro e resguardado. Sou muito mais feliz desde que aprendi a arranjar alguém que preencha as minhas falhas, que seja o culpado do que corre mal na minha vida, desta forma passo por entre os pingos da chuva e que bem que eu pareço sempre perante os outros. O tempo que vivemos é complexo, deixa-me lá mas é arranjar alguém que me substitua nas decisões a tomar.