Jornalista e escritor trabalhou na televisão e em jornais como “A Bola”, “Diário de Lisboa” e “Diário de Notícias”. Publicou vários livros de ficção: Crónica dos Bons Malandros, em 1980, que teve grande sucesso e deu origem a uma longa-metragem de Fernando Lopes; Histórias do Fim da Rua, em 1983; À Noite Logo se Vê, em 1986; e Talismã, em 2015, entre outros.
Mário Zambujal apresentou, recentemente, na XXIII Feira do Livro de Alcácer do Sal, a sua mais recente obra literária, intitulada Rodopio. Um conjunto de “pequeninas histórias bizarras”, contemporâneas, que falam dos inúmeros caminhos pelos quais as relações sentimentais, entre homens e mulheres, podem evoluir.
Texto José Serrano
É o rodopio do seu livro o corrupio do coração, quando dá de frente com o amor?
Neste livro há muito rodopio de vontades e de emoções humanas nas pequeninas histórias bizarras que o constituem. São histórias contemporâneas de gente comum em situações e com histórias de vida invulgares. Histórias sentimentais, relações entre homens e mulheres muito diversificadas, que levam a vários caminhos. São casos imaginários que podem muito bem ter acontecido, porque a natureza humana é cheia de surpresas. Cada pessoa é um universo próprio. Essa riqueza imensa, da diferença entre cada um de nós, permite ao ficcionista imaginar infinitos mundos.
Nos seus romances é possível encontrar uma miríade de personagens, com desassossegos e índoles muito diferenciadas entre si. Cabem todas elas num café de Lisboa ou do Alentejo?
Pois cabem, pois cabem. As pessoas são sempre todas diferentes umas das outras. Mesmo aquelas que, exteriormente, poderão parecer perfeitamente banais – nos gestos, nas atitudes nos usos e costumes – têm, no fundo, uma história na sua vida que se pode revelar interessantíssima, com surpresas e mistérios.
O seu trabalho como jornalista, no qual é exigido o rigor factual, facilita ou dificulta-lhe a sua tarefa de escritor?
Um jornalista tem de verificar o universo que o rodeia, o real. Enquanto escritor posso partir do real e caricaturá- -lo, pôr-lhe um nariz mais comprido, as orelhas mais largas… As minhas personagens, ainda que ficcionadas, são extraídas da realidade. Depois, o que lhes acontece é ir-lhes acrescentado percursos de vida que não serão exatamente os mais comuns, mas que poderão perfeitamente existir. Poder escrever as coisas mais bizarras é a liberdade suprema da ficção: se eu quiser escrever que Beja está a ser atravessada por uma manada de elefantes azuis eu posso fazer isso, tranquilamente, sem constrangimentos.
A sua condição de alentejano influência a sua criação literária?
A parte geográfica acaba por não influenciar a minha escrita, porque o cenário das minhas histórias é sobretudo a cidade de Lisboa. Mas há um estilo de humor alentejano, muito particular, que eu tenho a impressão que me tocou. Tal como a utilização do gerúndio. Um amigo meu dizia-me: “É pá, tens ali uma data de gerúndios, aquilo é brasileiro?”. Não, não é. É alentejano, disse-lhe eu. Antes dos brasileiros já a gente dizia “está comendo”, “está dormindo”, “vamos andando”. O emprego dos gerúndios é muito natural no Alentejo, se calhar foram os alentejanos que o levaram para o Brasil. Utilizo muito o gerúndio. É melhor dizer “está comendo” do que “está a comer”.