Diário do Alentejo

Cereais, preços, salários e desenvolvimento do Alentejo

15 de março 2024 -
50 anos de Abril

Texto Aníbal Fernandes

 

Em 1974 vivia-se em plena crise do petróleo. Tal como hoje, a inflação – que agora resultou da guerra na Ucrânia – fez subir os preços da energia com reflexos, desde logo, na agricultura.

Nos dias que correm, os agricultores europeus manifestam-se, um pouco por todo o lado, contra o aumento dos fatores de produção e da concorrência desleal de outros países que não são obrigados a cumprirem as regras ambientais vigentes na União Europeia.Num artigo de opinião publicado na edição de 9 de março de 1974, o autor – que assina apenas pelas iniciais JPC – fala sobre a política de preços fixos dos cereais: vale a pena ler e comparar.

“Em 1972, o país importou 192 005 toneladas de trigo e mistura de trigo e centeio, 17 197 toneladas de centeio, 121 314 toneladas de cevada e l 738 toneladas de farinhas de cereais vários. Todas estas importações custaram em divisas o equivalente a 626 241 contos [cerca de 3,1 milhões de euros]. No ano de 1973, em resultado da escassez mundial de trigo e consequente subida das cotações nos mercados internacionais, este produto chegou a ser importado a 5$40 [cerca de 2,5 cêntimos de euro] o quilo (mês de Agosto), conforme informou a Associação Central de Agricultura Portuguesa, enquanto em 1972, o preço médio do quilo de trigo e de mistura de trigo e centeio importado foi de 2$12”.

Perante este cenário, o articulista questiona: “Sendo assim, qual deve ser a orientação a tomar pelo País? Continuar a produzir trigo a preço incompatível com a viabilidade económica da sua cultura até à exaustão completa dos produtores que a ela se dedicam fora das áreas mais aptas ou consentir que o preço suba o suficiente em função do custo médio de produção, de modo a permitir que a agricultura retome fôlego? (…) A realidade, porém, a dura realidade é que o Alentejo é como a natureza o fez, com solos no geral maus e com um clima desfavorável para as culturas de sequeiro e não se vê como é possível mercê de um planeamento económico alterar profundamente as condições edáfio-climáticas da maior parte da área até agora cultivada com trigo.

Qual então a opção, válida para essa imensa área quando se entende que é preferível importar trigo em quantidades cada vez maiores a produzi-lo na medida possível do País? Pois será exactamente a tal resultado que se chegará se se persistir na fixação de um preço que não atenda ao custo de produção e à remuneração justa dos capitais investidos na cultura.

E no fundo quem se pretende proteger com a política do pão barato? Os trabalhadores rurais que estão na origem do produto de que aquele é feito? Pois faça-se um inquérito junto deles e logo se verá que a resposta é a de que se consideram as maiores vítimas de tal política, que os impede de auferir melhores salários. Ela esteve em parte na origem da emigração alentejana, ela poderá ser a causa da sua continuação e do seu incremento, ela poderá vir a ser a grande responsável pela desertificação e pela impossibilidade futura do desenvolvimento do Alentejo”.

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Como se viu na última edição, o setor militar, em março de 74, não andava nada pacífico. Numa notícia publicada no dia 15, no “Diário do Alentejo”, dava-se conta de que a “Secretaria-Geral da Presidência do Conselho (…) remeteu para publicação no ‘Diário da República’ o despacho que exonera os generais Francisco Costa e Gomes e António Sebastião Ribeiro de Spínola dos cargos de chefe e vice-chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, bem como o despacho que nomeia o general Joaquim Luz Cunha para o primeiro dos referidos cargos”.

 

Na coluna ao lado, numa breve, informava-se que “o Presidente do Conselho, Prof. Marcello Caetano, recebeu ontem, no salão nobre do Palácio de S. Bento, oficiais generais dos três ramos das Forças Armadas, que ali foram demonstrar o seu apoio à acção seguida pelo Prof. Marcello Caetano no que respeita à política de defesa das províncias ultramarinas portuguesas”.

 

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