Diário do Alentejo

“Quero acreditar que a esperança fez um pacto com a vida”

03 de novembro 2023 - 09:55
Universidade de Évora distingue Bru Junça, contadora de histórias
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Bru Junça, 40 anos, natural de Évora 

É licenciada em Educação de Infância pela Universidade de Évora. É mediadora de leitura/contadora de histórias, em Portugal e no estrangeiro, em escolas, bibliotecas municipais, escolares e itinerantes, ludotecas, associações socioculturais, lares e centros de dia, estabelecimentos prisionais, livrarias…

 

Texto José Serrano

 

Bru Junça é a vencedora do Prémio Carreira Alumni 2023, distinção anual entregue pela Universidade de Évora (UÉ), que visa reconhecer um diplomado que se tenha destacado pela sua carreira profissional e cívica e que, sendo uma referência para os seus pares e para a sociedade, contribua para a consolidação da imagem da UÉ enquanto instituição de ensino de referência.

 

Qual o sentimento que experimentou ao saber desta distinção? Fico muito feliz por esta atribuição ser dada à área da educação e, sobretudo, ao ofício ao qual me dedico – a palavra. Ver materiais com os quais trabalho todos os dias, como os livros para a infância e os textos tradicionais, serem valorizados, deixa-me imensamente feliz.

Podemos dizer que, com este prémio, a tradição oral popular entra, definitivamente, na academia, como doutor honoris causa? Não, de todo. É um prémio carreira, atribuído a um aluno pelo seu percurso.Premeia esta distinção, também, a paixão pelos contos e pela palavra literária, partilhada por todos os contadores de histórias? Sem dúvida. Para que hoje possamos viver da profissão de contador de histórias devemos isso a António Fontinha, quando, há trinta e tal anos, este lugar da palavra era um universo estranho. António Fontinha, juntamente com investigadores e outros contadores de histórias, fizeram, e fazem, um trabalho de resgatar este património coletivo que, hoje, felizmente, podemos encontrar num catálogo. No entanto, todos nós temos o nosso património íntimo… as histórias que eu ouvia, as canções, as lengalengas, as versões que ficaram na minha orelha pela voz de quem mas contou – é aí que mora um dos segredos. O prémio recai pelo uso destes textos tradicionais e dos belíssimos livros de autor, para a infância, que hoje temos no plano editorial. A valorização, por parte do meio académico, deixa-nos com esperança que se lance um outro olhar sobre um trabalho tantas vezes desvalorizado.

Participa, anualmente, em vários encontros de literatura para a infância, mediação leitora e narração oral, em Portugal e no estrangeiro. Ainda que as suas apresentações possam ser dirigidas a públicos diferentes, existe um objetivo comum em todas as suas apresentações? A relação com o outro. É isso que me move, relacionar-me através das palavras que carrego, estejam elas na orelha, pelos textos da tradição oral, ou nos textos de autor, de leitura em voz alta. Procuro estar. Criar pontes. Conversas que (re)signifiquem. Voltar ao início, ao uno, ao, quase, do um para um.

Era uma vez… Esperança… contam que a miséria fez um pacto com a morte e que é por isso que ainda hoje existe no mundo… eu quero acreditar que a esperança fez um pacto com a vida e, enquanto pulsar, a esperança permanece. E a palavra contada, também.

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