Diário do Alentejo

Em Beja, “a pobreza envergonhada é uma tendência crescente”

26 de outubro 2023 - 13:00
“São muitas as pessoas a recorrer a instituições de apoio”, afirma o presidente do Núcleo Distrital de Beja da EAPN Portugal
Foto | José Ferrolho/ArquivoFoto | José Ferrolho/Arquivo

A EAPN Portugal – Rede Europeia Anti-Pobreza tem em curso uma campanha que pretende por em evidência o problema da pobreza e exclusão social vivido no País. No âmbito regional, João Martins, presidente do Núcleo Distrital de Beja da EAPN Portugal, expõe que o território apresenta “problemas graves”, transversais a vários perfis sociais, nomeadamente, no âmbito das necessidades alimentares e da habitação. Considera este responsável que “a solução tem de passar por uma liderança forte, que garanta a coordenação de esforços entre diferentes atores e entidades” na “execução de uma estratégia regional de combate à topologia de pobreza que mais afeta o Baixo Alentejo”.

 

Texto  José Serrano

Da responsabilidade da EAPN Portugal – Rede Europeia Anti-Pobreza, decorre uma campanha nacional para sensibilização da sociedade e dos poderes políticos, através de 10 cartazes (#POBREPOVO) “que revelam testemunhos reais de pessoas em situação de pobreza e exclusão social”.

 

As frases inscritas nos cartazes – a exemplo de “um em cada dois adultos em situação de pobreza está empregado” ou “duas em cada dez pessoas têm sobrecarga financeira com despesa de habitação” –, são reforçadas com vídeos publicados nas redes sociais, apresentando “retratos dramáticos, mas verídicos, da realidade da pobreza em Portugal”, refere um comunicado da EAPN Portugal. Assim, esta organização não governamental de solidariedade social considera a urgência de se olhar o combate à miserabilidade, enquanto desígnio nacional, consubstanciado em ações concretas e não como “mera retórica”, refletida “em medidas avulsas e temporárias que apenas aliviam as situações de pobreza mas não as eliminam”.

 

João Martins, presidente do Núcleo Distrital de Beja da EAPN Portugal, revela ao “Diário do Alentejo” que, espelhando a pobreza existente na região, há “problemas graves” no âmbito das necessidades alimentares, aos quais, todavia, através de “um conjunto de entidades, tais como, o Centro Distrital de Segurança Social, o Banco Alimentar Contra a Fome  e a Cáritas Diocesana, de Beja, entre outras”, se tem conseguido, “até ao momento, dar resposta”.

 

Também a habitação é referida por este responsável como uma das principais carências existentes em Beja, “quer ao nível da aquisição ou da renda, que apresentam valores elevados”, atingindo diferentes estratos da sociedade, nomeadamente, estudantes, famílias, idosos e comunidades específicas.

 

João Martins evidencia que “a pobreza no Baixo Alentejo está, sobretudo, associada ao envelhecimento populacional e às baixas reformas, às comunidades ciganas e, mais recentemente, aos migrantes”. No entanto, “decorrente do aumento da inflação, do custo de vida e das elevadas taxas de juro”, o responsável da EAPN Beja sublinha a constatação do impacto das dificuldades económicas a outros perfis sociais, “sobretudo, em famílias jovens da classe média”, nomeadamente, as que contraíram empréstimos para a habitação.

 

“São muitos os casais jovens que estão a cortar despesas na alimentação e a recorrer a apoios da família ou, de forma muito ‘envergonhada’ (a pobreza envergonhada é uma tendência crescente), a instituições de apoio”, para fazer face às dificuldades sentidas. Também nas comunidades ciganas “existem graves problemas que, porventura, podem passar despercebidos” à maioria dos cidadãos. Contudo, para além desta precariedade dissimulada, “existem dimensões que começam a ter alguma visibilidade”, refere João Martins, “como é o caso das comunidades migrantes, em que os problemas de habitação e do trabalho sazonal e precário” se constituem como preocupantes, “não obstante o enorme esforço de um conjunto de entidades para tentar, diariamente, combater a pobreza e, de alguma forma, fruto da sua ação, conseguir dar algumas respostas”.

 

Para debelar, a nível regional, este emergente problema social, João Martins afirma a necessidade de “execução de uma estratégia regional de combate à topologia de pobreza que mais afeta o Baixo Alentejo”. Importa por isso, diz, existir “uma liderança forte”, capaz de garantir “a coordenação de esforços entre diferentes atores e entidades, públicas e privadas – num passado recente encontrava-se na figura do governador civil essa função”. Esforços concertados que deverão incidir, entre outras medidas, de acordo com João Martins, numa maior “fiscalização das condições de trabalho e de habitabilidade” e num maior controlo “das empresas de prestação de serviços de mão de obra sazonal”.

 

O combate à pobreza é um “desígnio de todos os cidadãos, que passa por encontrar e trabalhar soluções efetivas que promovam direitos e obrigações”, acentua.

 

Desta forma, “a existência de uma Estratégia Nacional de Combate à Pobreza e de instrumentos como o Plano de Recuperação e Resiliência, a que se associa todo um sistema de incentivos associados ao Portugal 2030 e Alentejo 2030, constituem uma excelente oportunidade para que, de forma efetiva, se possa erradicar a pobreza na nossa região, no nosso país”, conclui.

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