Diário do Alentejo

Do Alentejo até ao Alémundo

02 de setembro 2022 - 12:00
“Não me importo de não seguir o estipulado pela sociedade e de ser diferente do dito normal, porque sei que posso fazer a diferença”
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Duarte Zemp é o responsável por “Alémundo”, o projeto vencedor da edição deste ano da bolsa Lobo Scholarship, promovida pela Gap Year Portugal e financiada pela Fundação Lapa do Lobo. O jovem de 17 anos deixará o seu monte em Serpa para rumar, por sete meses, ao Perú, Costa Rica e Equador para “tentar tornar o mundo num lugar melhor”.

 

Texto Ana Filipa Sousa de Sousa

 

Os próximos dias serão de ansiedade e nervosismo para a maioria dos jovens que concorreram ao ensino superior. Os resultados da 1.ª fase do concurso nacional de acesso são divulgados a 12 de setembro, sendo apenas no final do mês afixados os referentes à 2.ª fase de ingresso.

 

Porém, Duarte Zemp, um jovem estudante de Serpa, não será um deles. Após a conclusão do 12.º ano na área de humanidades no Liceu Diogo Gouveia, em Beja, contrariou o rumo “normal” e não se candidatou a nenhum curso superior.

 

A ideia de parar durante um ano para perceber o que efetivamente queria seguir profissionalmente vinha a ser amadurecida desde o início do secundário e na última edição da Futurália, a Feira de Educação e Formação destinada aos jovens que estão prestes a entrar no ensino superior, profissional ou pós-graduação, percebeu que seria “curioso” candidatar-se a uma bolsa gap year  [ano sabático].

 

“Já tinha a ideia de fazer um gap year desde o 10.° ano e essa ideia foi-se maturando e passou por diversas fases, destinos e projetos, ao longo destes dois anos e meio onde pensei acerca disto. Na Futurália 2022, enquanto todos os meus colegas se interessavam bastante em relação ao ensino superior e faziam a comparação dos diversos estabelecimentos e as suas condições, eu, por outro lado, encontrava-me apenas a percorrer o recinto e as suas ofertas, mas nunca demonstrando grande atenção ou interesse. Isto tudo mudou quando vi o expositor da Gap Year Portugal e comecei a conversar com os seus representantes de comunicação e marketing. Apresentaram-me aí a existência da bolsa e eu comecei a pensar que seria curioso, não ganhar, pois nunca achei possível, mas sim uma forma interessante de me associar à organização e ter algum contacto com pessoas com o mesmo espírito e interesses que eu, enquanto ia planeando, de forma mais ativa, o meu próximo ano”, começa por contar ao “Diário do Alentejo” o jovem de 17 anos.

 

Rapidamente se candidatou e, no final do mês passado, ficou “em choque” ao saber que “Alémundo”, da sua responsabilidade, era o projeto vencedor da bolsa deste ano.

 

“[Ganhar] foi um choque! Não estava nada a contar, de tal modo que, mesmo a concorrer ao concurso, criei um plano B em que, caso não ganhasse a bolsa, limitaria a minha viagem, mas ao menos torná-la-ia possível. Apesar de me ter esforçado muito e nunca ter desacreditado do projeto em si e do impacto que ele poderia ter, nunca equacionei ganhar. Para ser sincero, apesar de a notícia me ter sido dada há mais de um mês ainda me impressiona e deixa francamente orgulhoso”, desabafa.

 

 

“ALÉMUNDO” DE PORTUGAL ATÉ ÀS AMÉRICAS

Com os olhos postos na “descoberta deste mundo e de todos os seus recantos”, mas sem esquecer o Alentejo que lhe aquece o coração, Duarte Zemp fez questão de simbolizar estas duas paixões no nome do seu projeto: Alémundo.

 

“O nome surgiu no decorrer da candidatura através de um jogo de palavras. ‘Alémundo’ pode ser separado em além e mundo e pretende passar a ideia de descoberta deste mundo e de todos os seus recantos. A acrescentar, a parte inicial da palavra (“além”) coincide com o ‘Alen’ de Alentejo, que é onde eu vivo e queria de certo modo incluir isto no projeto, para que simbolizasse que, mesmo estando fora do país, eu continuo a sentir um grande carinho por Portugal e pelo Alentejo em especial”, explica animado ao “DA”.

 

Com a certeza de que queria crescer pessoalmente e fazer a diferença pelos sítios onde passasse, estudou e escolheu vários países com realidades e formas de vida diferentes e juntou-os aos seus gostos pessoais, para perceber quais iriam ao encontro das suas expectativas e objetivos.

 

“Na minha pesquisa dos países que poderiam integrar o projeto tive o cuidado de fazer uma seleção precisa, consoante aspetos que me interessavam e que de certa forma me tirariam da minha zona de conforto, tendo em vista também o meu crescimento pessoal. Estes variaram bastante, desde uma cultura diferente a tipos de fauna, flora, clima, idioma, segurança e, principalmente, de locais onde o voluntariado pudesse ter um impacto mais efetivo”, refere.

 

Da sua procura resultou a eleição do Perú, Equador e Costa Rica, para partir, em janeiro do próximo ano, à descoberta.

 

SETE MESES DE SUSTENTABILIDADE E VOLUNTARIADO

Assente nos 17 objetivos da Agenda 2030 da Organização Mundial das Nações Unidas (ONU), a sustentabilidade e o voluntariado adquiriram, desde muito cedo, um importante papel no “gap year” do serpense.

 

O peso de aprender e dar a conhecer várias formas sustentáveis de preservar o meio ambiente e as sociedades são o foco primordial da missão.

 

Durante os próximos setes meses, Duarte Zemp integrar-se-á, nessas comunidades, em projetos de voluntariado local nas áreas do turismo, agricultura, pecuária, hotelaria e desporto e, mais tarde, de forma autónoma, em contato direto com os moradores fora das zonas turísticas.

 

Para o vencedor, a ajuda acrescida que dará às organizações [de voluntariado] e a si próprio através de “uma sensação de utilidade” “justifica e vale mesmo a pena” este projeto.

 

“APÓS ESTA EXPERIÊNCIA NÃO SEREI O MESMO DUARTE”

A poucos meses de rumar até às Américas, o jovem, que se descreve como alguém empático, empenhado e curioso, admite que, “sem sombra de dúvidas”, a família e os amigos serão as saudades mais presentes que terá de casa. Do tempo que estará fora espera “trazer uma série de experiências e conhecimentos aliados a um sentimento de gratidão e de missão cumprida”.

 

Ao “DA” assume também que não pretende ser o foco do Alémundo, mas sim que este seja o “impacto que possa eventualmente causar” tanto na “ajuda a quem precisa” como “em mostrar que a universidade não é a saída obrigatória para todos”.

 

Há quem lhe diga que após esta experiência não será mais o mesmo e Duarte acredita nisso. “Tenho ouvido mais do que nunca que após esta experiência não serei o mesmo Duarte. Não sei ao certo o que isso significa, mas espero crescer, adquirir mais conhecimentos e experiências que me poderão ser úteis ao longo da minha vida”, conta.

 

O que encontrará, não sabe, o que trará na mala, também não. A única certeza é que virá carregado de vivências, alguns sonhos concretizados e vários objetivos cumpridos. Longe das planícies alentejanas, do pão, do queijo e do cante, não teme o que o espera, receia o que não possa mudar.

 

Está agora em contagem decrescente para dar asas “além mundo”.

 

OS 17 OBJETIVOS DA AGENDA 2030 DA ONU

A edição deste ano da bolsa Lobo Scholarship solicitava projetos que incluíssem os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU.

 

Desta forma, os planos apresentados deveriam mencionar formas de contribuir para erradicar a pobreza e a fome, melhorar a qualidade na saúde e na educação, aumentar a igualdade de género, a água potável e o saneamento, as energias renováveis e acessíveis, os trabalhos dignos e o crescimento económico, as industrias, inovação e infraestruturas, a paz e o número de instituições de justiça eficazes, as cidades e as comunidades sustentáveis, bem como as produções e os consumos sustentáveis, reduzir as desigualdades, olhar para a ação climática e proteger a vida marinha e a vida terrestre.

 

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