Diário do Alentejo

Está a nascer em Mértola um medronho “inovador”

15 de março 2022 - 15:25

Se tudo correr bem, no próximo verão já poderá provar um medronho com sabores a fruta e pouco teor alcoólico cujo processo de desenvolvimento está em fase final em São Pedro de Sólis, Mértola.

“Medronho Bottle” é o nome dado por Ludovico Gago a uma ideia simples, mas que tem já muito trabalho por trás.

 

Texto Aníbal Fernandes

 

Nasceu em França há 37 anos, filho de pai algarvio, de Alcoutim, e mãe alentejana, de Serpa, mas veio para Mértola com apenas cinco anos. No início o seu futuro perspetivava-se na engenharia eletrotécnica, área em que é licenciado pela Universidade de Faro. No entanto o destino e o mercado de trabalho trocaram-lhe as voltas e a agricultura tornou-se o seu porto de abrigo.

 

O final do curso coincidiu com uma altura de crise e os ordenados na área eram “muito baixos”. Chegou a trabalhar na área, mas a fazer trabalhos para os quais tinha qualificações a mais, e em lojas da especialidade o que ficava aquém das suas expectativas. Nas conversas com os pais, sobre a sua situação profissional, os baixos ordenados eram tema recorrente, até que a mãe o “despertou para a agricultura”. A família tinha adquirido uma herdade com 250 hectares onde geria um negócio agropecuário.

 

 Os pais cederam-lhe uma parte do terreno para se poder iniciar na atividade que ao princípio apontava noutra direção. “Pensei primeiro em olival, porque era o que estava a dar”, mas umas conversas com técnicos do Crédito Agrícola do Algarve e a análise da terra na Direção Geral de Agricultura sugeriam o medronho como alternativa.

 

“Comecei a estudar a cultura do medronho e depressa conclui que era uma boa aposta até porque é resiliente em situação de seca”. No início a ideia era colher e vender a outras destilarias, mas a situação não lhe agradava. “Procurava uma forma de acrescentar valor ao produto”, explica Ludovico Gago. Ele, que nem álcool bebe, reparou que a “malta nova bebia um ou dois copos” e questionou-se se não poderia inventar uma bebida com menos teor alcoólico e concorreu a um concurso de ideias na Universidade de Faro onde ganhou uma menção honrosa.

 

A professora Ludovina Galego, especialista em medronho, do departamento de inovação da universidade (CRIA), foi essencial no arranque do projeto. Hugo Barros, coordenador do CRIA – que tem forte ligação à indústria - achou que a ideia tinha pernas para andar. Daí até à criação de uma equipa multidisciplinar para apoiar o projeto e com Matilde Gouveia, licenciada em engenharia alimentar, a trabalhar a tempo inteiro no projeto, foi um passo.

 

“Temos feito testes com alguns empresários e as formulações estão definidas”, no entanto ainda subsistem dúvidas quanto à quantidade de gás e ao modelo de conservação que pode ser alta pressão ou pasteurização.

 

Neste momento estão a estudar o Portugal 2020 para tentar aceder a fundos que permitam avançar com a instalação da destilaria e linha de engarrafamento no Monte Gatão, em Mértola. A escolha é óbvia pois a propriedade é deles e têm água e energia em painéis solares.

 

Para Ludovico Gago, este projeto “ é o desenvolvimento de uma bebida inovadora à base de medronho, mas com a diferença de esta ser uma bebida de baixo teor alcoólico. O medronho costuma ser uma bebida forte com 30º/40º de volume mas nós queremos fazer uma com baixo teor alcoólico, uma combinação do medronho álcool com o medronho fruto, portanto sumo, em que a taxa de álcool ande a volta dos 4/5 graus. Este projeto é completamente inovador. Existe o medronho, existe a melosa, existem gins e existe a aguardente, mas são bebidas muito fortes. Nós queremos encontrar uma alternativa ao consumo de mais baixo teor alcoólico.”

 

Acresce que com as alterações climáticas e com períodos de seca cada vez mais intensos e duradouros, o medronho apresenta-se como uma planta que necessita de poucos recursos hídricos. “É um arbusto que não precisa de muita água, produz sempre, se não tiver água produz um pouco menos, mas produz todos os anos. É um produto biológico, um produto que não precisa de fitofármacos, um produto autóctone, da nossa região”, explica Ludovico.

 

EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO

 O facto de este projeto ser finalista do Prémio Empreendedorismo e Inovação do Crédito Agrícola, “é um que estamos a fazer nestas zonas rurais que também têm a possibilidade de fazer alguma coisa.”

Este prémio tem o apoio da P-BIO – Associação Portuguesa de Bioindústria e vai na oitava edição. Este ano conta com 3 categorias abertas a concurso público, alinhadas com as prioridades do Pacto Ecológico Europeu da Comissão Europeia: a categoria Agro-indústria 4.0, para premiar soluções tecnológicas digitais que promovam a otimização da produção e a gestão eficiente de recursos; a categoria Biotecnologia e Bioeconomia, destinada a projetos que desenvolvam soluções biotecnológicas que respeitem os princípios da economia circular e da bioeconomia e a categoria Produtores Inovadores que se destina a produtores agrícolas ou florestais que incorporem tecnologias ou desenvolvam modelos de negócio inovadores e sustentáveis.

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