Diário do Alentejo

Ministro quer pôr “travão” a novas vinhas

28 de abril 2024 - 12:00
Setor tem dúvidas e defende continuidade do programa Vitis como ferramenta essencial à competitividade

Na primeira entrevista concedida a um órgão de comunicação social, quinze dias após a tomada de posse como ministro da Agricultura e Pesca, José Manuel Fernandes declarou-se contra novos “apoios para vinha nova” e defendeu “um travão” a essa prática. Em sentido contrário manifestou-se Francisco Mateus, presidente da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), considerando que não existem “vinhas a mais”. Também José Miguel Almeida, presidente do conselho de administração da Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito, diz que a solução pode passar pela restrição na atribuição de autorizações para a plantação de novas vinhas, mas defende a continuidade do programa Vitis que considera uma “ferramenta de apoio à competitividade dos vinhos portugueses”.

 

Texto Aníbal Fernandes* Foto Ricardo Zambujo

 

Numa entrevista dada ao “Público”, José Manuel Fernandes considerou que “já se deveria ter parado há muito os apoios para vinha nova”. O ministro da Agricultura e Pesca diz haver um “problema brutal” com o stock de vinho que, numa parte significativa, tem como destino a “destilação”.

O até há poucos dias deputado europeu diz que, através do programa Vitis (80 milhões até 2025), “tem-se andado a dar dinheiro para plantar vinha nova” e defende um “travão”, “caso contrário estamos a prejudicar todos e a deitar dinheiro fora”.

“Algum português percebe que se esteja a dar recursos financeiros para plantar vinha e depois para arrancar vinha ou para o vinho ser destilado ou para coisas que vão contra a nossa alma e as nossas raízes?”, questiona José Manuel Fernandes, acrescentando que já é prática corrente “a vindima verde, que é retirar os frutos da árvore antes de eles estarem maduros para deitá-los fora”. Em declarações prestadas à “Lusa”, Francisco Mateus, presidente da CVRA, lembrou que as vinhas são plantadas por iniciativa dos agricultores, que “certamente farão as contas necessárias” para concluírem se devem ou não plantar mais nos terrenos.

“Eu acho que não temos vinhas a mais, podemos é, em determinados momentos, estar com um excesso de produção ou com um excesso de stock, que tem a ver com anos melhores em termos de produção, tem a ver também com a diminuição de vendas”, disse.

Francisco Mateus diz que “há momentos em que as situações agudizam”, mas que o “problema grande” é quando o agudizar da situação “conduz a situações estruturais” que depois não se conseguem resolver facilmente no setor.

O presidente da CVRA prefere pensar que “o alerta do senhor ministro” vai no sentido de “repensar as várias medidas que temos em cima da mesa, os efeitos que elas estão a ter, para tentarmos ter um futuro mais equilibrado em termos de produção da vinha e depois em termos de comércio”.

No entanto, Francisco Mateus considera que o ministro fez uma “interpretação irrealista” dos dados, no que se refere ao programa Vitis, uma medida de apoio à reestruturação e reconversão de vinhas.“Eu diria que me parece que o senhor ministro está a fazer uma interpretação irrealista dos dados, naquela parte relativa ao Vitis, acho que falta aqui acrescentar uma questão que é o facto de o Vitis ter de ser visto como uma medida do garante da competitividade”, diz, considerando, ainda, no que respeita à questão climática, que o Vitis poderá financiar essa adaptação, nomeadamente, com a introdução de sistemas avançados de produção sustentável. “O Vitis não deve ser visto como um problema, mas parte da solução”, concluiu.

 

Promoção e competitividade José Miguel Almeida, responsável da Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito, considera que a avaliação feita pelo ministro quanto à situação atual – no que diz respeito aos stocks e à quebra no consumo – é “correta”, mas defende que o controlo da área de produção deve ser feito através da diminuição das autorizações para a instalação de novas vinhas. “Há poucos anos esse valor era de 800 hectares por ano, mas em 2024 apenas foram autorizados 100 novos hectares no Alentejo”, explica.

Já quanto ao programa Vitis, defende a sua continuidade, uma vez que “se destina à recuperação e reconversão de vinhas velhas”, configurando-se como “uma ferramenta essencial para a competitividade do setor”.

José Miguel Almeida defende ainda que o Governo deve promover “uma campanha de promoção do vinho português, desde logo no nosso maior mercado que é Portugal”. Isto porque, diz, “todos os anos são importados cerca de 100 milhões de litros de vinho de Espanha”, o que daria para acabar com o excedente nacional.

 

*com “Lusa”

 

Área de vinha quase quadriplicou numa década no Alqueva

 

Em 2023, segundo o “Anuário Agrícola do Alqueva” editado pela Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA), na sua área de intervenção, foram contabilizados 5447 hectares de vinha para vinho e 540 hectares para uva de mesa. Este número compara com 1543 hectares que estavam cadastrados em 2012. O Alentejo – na sua totalidade – é líder nacional em vinhos certificados, com cerca de 40 por cento do valor total das vendas no universo das 14 regiões vitivinícolas em Portugal.

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