Diário do Alentejo

‘Ranking’ de inovação. Mais do que uma queda, o retrato de uma realidade
Opinião

‘Ranking’ de inovação. Mais do que uma queda, o retrato de uma realidade

Maria da Graça Carvalho, eurodeputada

12 de agosto 2021 - 15:55

A descida de sete lugares no Ranking Europeu de Inovação, que voltou a colocar-nos entre os países moderadamente inovadores apenas um ano depois de termos chegado pela primeira vez ao grupo da frente, não é obviamente uma boa notícia. No entanto, os indicadores relativos ao nosso País têm a virtude de deixarem bem claros os problemas de fundo que nos impedem de crescer ao ritmo a que desejaríamos e que nos levam até a desperdiçar muitos dos ganhos, nomeadamente em termos de qualificação da população e de capacidade científica, que fomos registando ao longo dos anos.

 

Mais do que uma quebra geral, que não acontece, porque continuamos a evoluir em diversos campos, Portugal é particularmente "penalizado" no ‘ranking’ pelo facto de este ter passado a incluir um conjunto de oito novos indicadores muito ligados ao setor privado, nomeadamente à indústria. E o que estes nos dizem é que este setor ainda não conseguiu dar o salto para uma economia baseada no conhecimento e na inovação.

 

O investimento das empresas portuguesas em inovação, baseada ou não na investigação e desenvolvimento, não chega aos 50 por cento da média da União Europeia. E quando se analisa esse investimento por empregado a percentagem cai para apenas 25 por cento. As empresas e indústrias nacionais têm igualmente um desempenho fraco em indicadores relativos à sustentabilidade ambiental das suas atividades. Por exemplo, precisam de gastar muito mais matérias-primas para produzirem o mesmo que outros países. Mais uma vez, um sintoma de falta de aposta em conhecimento e tecnologias inovadoras.

 

As causas deste ‘status quo’ não são conjunturais. Os dados foram todos recolhidos antes da crise causada pela pandemia de covid-19. Não foi devido à crise que as empresas portuguesas investiram menos em inovação. Pelo contrário, o facto de não o terem feito poderá ter contribuído para que a crise se fizesse sentir no nosso País com maior intensidade do que noutros Estados membros. É sabido que, a nível europeu, a pandemia teve particular impacto nas pequenas e médias empresas (PME) e em setores com menor recurso a alta tecnologia e a mão-de-obra altamente qualificada. E Portugal é um país onde as PME têm um peso particularmente significativo na economia, registando-se ainda uma grande concentração das suas atividades em determinados setores, como a hotelaria, a restauração e o turismo.

 

Também não se pode atribuir o desempenho nacional no ‘ranking’ de inovação à falta de incentivos diretos do Estado às empresas. Os indicadores revelam-nos que, ao nível do apoio governamental aos negócios, estamos bem acima da média da UE, nos 126 por cento, sendo que registámos uma evolução constante desde os 91 por cento de 2014. E esse esforço, refira-se, tem sido feito com algum desinvestimento nos incentivos à inovação no setor público, que caíram de 87,7 para 83,6 por cento no mesmo período.

 

Resta-nos concluir que as causas são estruturais. Assentam numa prática ainda pouco virada para a inovação, por motivos que poderão ser em parte culturais, mas que se devem sobretudo à inexistência de um ecossistema geral - em termos de simplificação de procedimentos, incentivos fiscais, estabilidade das leis e funcionamento eficiente dos tribunais - que crie as condições de mercado para que os privados invistam.

 

A política deste Governo, e dos governos PS em geral, tem sido despejar dinheiro e recursos nos problemas sem resolver as questões de fundo nem promover as reformas necessárias. O desempenho português neste ranking de inovação mostra mais uma vez que esse não é o caminho. E esta deve ser uma lição a retirar para a aplicação do programa de recuperação e resiliência. Se não resolvermos os problemas de base, este programa será apenas uma ajuda a curto prazo, com poucos efeitos no crescimento, produtividade e competitividade do País.

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