Diário do Alentejo

O “tio” Barriga
Opinião

O “tio” Barriga

José Saúde, jornalista

12 de agosto 2021 - 09:30

O mundo do desporto é uma indelével essência onde dantes se cruzaram personalidades que muito deram de si em prol de uma agremiação que lhes terá eclipsado alguns dos excelentes prazeres não só na sua vida particular mas, sobretudo, familiar. Os tempos eram outros e a presunção como o dirigente cumpria integralmente o seu dever nos emblemas desportivos obedecia a éticos princípios onde a honra se apresentava como a bandeira de um ser humano literalmente analisado, no contexto da sociedade, como pessoa de bem.

 

É verdade que conheci uma linhagem de individualidades que, vistos à distância, me surpreenderam pela positiva. O “tio” Barriga foi uma dessas figuras típicas que me marcaram para a eternidade. Dirigente do Despertar, de Beja, o saudoso diretor entregou-se de alma e coração ao seu velhinho “Rasga”. Aliás, nesses idos, já afastados, os despertarianos tinham orgulho na gerência do seu clube.

 

Toda esta resplandecente dedicação começou no seu primeiro presidente, Manuel Gonçalves Peladinho, o “maestro” que legou saberes aos governantes seguintes. Numa meticulosa pesquisa pelos primórdios do Despertar Sporting Clube, fundado a 24 de junho de 1920, Manuel Peladinho contou com Libânio Rosa Pereira, Joaquim Bernardo de Sousa, Alfredo Almeida Barradinhas, António da Graça Sardinha, Artur Modesto, Eduardo Modesto, Henrique José Careto Júnior, António Castilho, João Castilho, Artur Silva, Manuel Valadas Mendes, Hilário Gomes da Silva, Teotónio Mendes, Manuel Venâncio e André Sequeira que, a seu lado, estiveram na origem do símbolo bejense.

 

Nessas longínquas eras, e com homens ao leme de uma embarcação que navegava em águas já seguras, o Despertar surgiu de uma fusão entre dois grupos de jovens: o Libertário e o Infantil. Rapazes que tinham idades compreendidas entre os 13 e os 15 anos, mas sendo todos eles já operários, existindo então uma disputa sobre o nome a dar ao clube. Uns defendiam Despertar Sporting Clube; outros Despertar Benfica Clube. Venceu, o primeiro, visto que os sportinguista eram a maioria.

 

Assim sendo, afirmo, seguramente que o Despertar sempre foi uma coletividade que primou pelo fator da formação. Recuo à época de 1964/65 e dou por mim a vestir a camisola de listas verticais vermelhas e pretas, com calção branco, no escalão de juvenis, do grémio da velha Pax Júlia que tinha como presidente Zeca Pereira, sendo o “tio” Barriga um indivíduo que possuía o dom de bem lidar com a juventude. Era um homem calmo. Envergando, normalmente, um casaco que lhe assentava como uma luva, lá se entretinha a orientar a rapaziada, dando-lhes bons conselhos, sendo que à noite era comum vê-lo na sede, local onde habitualmente a rapaziada se reunia. Nesses tempos havia um outro dirigente que, amiúde, acompanhava a equipa: Januário Correia. Mas o “tio” Barriga, homem que residia na avenida Miguel Fernandes, em Beja, ficou-me perpetuado na memória, pois sua dedicação ao Despertar foi simplesmente colossal.

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