Diário do Alentejo

O interior do nosso País
Opinião

O interior do nosso País

Manuel Camacho, engenheiro

11 de junho 2021 - 17:05

Durante muitos anos, especialmente nas transatas décadas de 80 e de 90, fui assinante assíduo do semanário regionalista “Jornal do Fundão”. Então, tive o ensejo de verificar como um órgão de comunicação social de caráter regional se transformou num porta-voz dos principais anseios de uma região do interior do país, que coletivamente pugnava por projetos estruturantes para o desenvolvimento da sua a região onde estava inserido, sob a batuta do seu mui digno diretor António Paulouro.

 

Dentro das principais reivindicações, relembro a necessidade de afirmação e consolidação do ensino superior através da Universidade da Beira Interior (UBI), o desenvolvimento do regadio da Cova da Beira, facultando aos seus agricultores um desenvolvimento agrícola há muito almejado e a construção do Túnel da Gardunha, permitindo assim uma maior acessibilidade ao sul do distrito da Beira Baixa.

 

Com ritmos diferentes, estes objetivos foram a seu tempo alcançados. A UBI é uma realidade inquestionável possuindo inclusivamente uma faculdade de medicina fora das principais e tradicionais academias de ensino superior do nosso país, o regadio nesta extensa região concretizou-se e a Serra da Gardunha foi esventrada para dar lugar a uma acessibilidade desejada, para além de uma autoestrada estruturante a designada A23. Ao invés a nossa região continua a marcar passo, inclusive não aproveitando algumas infraestruturas existentes, umas concluídas e outras deixadas a meio caminho da sua concretização.

 

Para além do papel relevante que este órgão de comunicação teve nas justas reivindicações encetadas, subsiste uma ideia perversa de que o alcance e a concretização de tais medidas só foi possível por, num período escasso de tempo, o país ter tido na condução de dois governos da nação, justamente dois primeiros-ministros (António Guterres e José Sócrates) originários da região, apesar do fraco peso que esta tem no panorama eleitoral do país, com similitudes a todo o Alentejo, contrariando assim a ideia de que para se realizarem investimentos em qualquer região do país, conta sobremaneira a aritmética eleitoral. Naturalmente que esta região, à semelhança de todo o interior do País, se debate com fortes constrangimentos para superar os amargos défices populacionais.

 

O Baixo Alentejo ao longo da sua história teve poucos protagonistas de topo na governação do nosso País, logo, esta ideia de que a influência decisiva no desenvolvimento do interior em algumas regiões se deve justamente porque os principais atores assim o possam ter influenciado, não é logicamente uma regra. Poderemos relembrar algumas figuras de renome que pela sua ação pouco notada vêm contrariar essa ideia salvífica e que nos últimos 100 anos, a título de exemplo, deixaram pouca memória de sucesso, como Brito Camacho (contando-se na minha terra a anedota de que perante tão veementes reivindicações dos seus concidadãos os despachou com uma pergunta incómoda: “Se não desejavam também de ter uma praia?”).

 

Ou seja, um país dever-se-á desenvolver de uma forma harmoniosa e nunca ficando refém de calculismos e conjunturas circunstanciais, antes, obedecendo a uma estratégia global inserida em objetivos que potenciem as mais-valias contidas no seu território considerado globalmente.

 

Valorando o papel que têm tido algumas organizações de cidadãos do nosso distrito, paralelamente o “Diário do Alentejo” deveria de assumir sem tibiezas as principais reivindicações da nossa região à semelhança do que a sua congénere teve decisivamente nas décadas passadas.

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