No último mês, as edições ‘online’ do “Diário do Alentejo” (página de internet e redes sociais) somaram mais de 152 mil leitores. Um pouco mais de 20 mil (que originaram 130 comentários no Facebook) leram a notícia acerca das mais de mil famílias que, no Alentejo, sobrevivem com necessidades graves de habitação.
Entre as diversas reações à publicação da reportagem, baseada em dados oficiais, houve bitaites de todo o tipo. Um deles, por exemplo, dizia: “Estas pessoas queixam-se que vivem sem condições habitacionais, mas o planeamento familiar não existe porque continuam a ter muitos filhos”. Note-se, por um lado, que em nenhum momento da reportagem havia alguém a queixar-se do que quer que fosse. O resto, de tão boçal, nem merece comentário.
A verdade é que este tipo de reações não é de hoje. Outros artigos, a propósito dos mais diversos temas, publicados no passado, obtiveram comentários idênticos, sobretudo quando se referem a preocupações ou necessidades da comunidade cigana, de imigrantes ou de desempregados. Este não é um fenómeno que tenha sido criado pelo tal partido que por aí anda. É anterior a ele. É dele que esse tal partido se alimenta.
Não por acaso, no dia em que escrevi o último editorial, onde tentei demonstrar que uma aliança com o dito partido, à semelhança do que foi feito pelo PSD de Rui Rio nos Açores, é contrária a todo o património histórico e civilizacional da social-democracia portuguesa, o homem foi multado pela Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (Cicdr) por discriminar ciganos numa publicação que fez no Facebook. É portanto, e à luz dos critérios da Comissão, um racista, com direito a multa e tudo.
“Estamos a viver um corte epistemológico na política portuguesa, em que a direita extremista nunca contou decisivamente”, sublinhou Ana Sá Lopes, em editorial no “Público”. Quando por toda a Europa – a começar em Angela Merkel que classificou como “um mau dia para a democracia” a tentativa de entendimento de alguma gente do seu partido com a extrema-direita racista e xenófoba – se traçam limites bem definidos (cordões sanitários, se quisermos ser rigorosos), em Portugal é o PSD que veio abrir a porta à “normalização” do tal partido.
Talvez se aperceba do erro nas próximas presidenciais, quando um dos fundadores do PSD [Marcelo Rebelo de Sousa] se transformar num dos alvos privilegiados dos extremistas.
Mas o que a crescente adesão às plataformas digitais do “DA” demonstra – o que os tais 152 mil leitores comprovam – é que o ódio derramado por essa gente não é, nem de perto nem de longe, o substrato que faz mover a sociedade. Por exemplo, a história, corajosa, plena de humanismo, do padre José Maria Coelho, capelão no hospital de Beja, chegou a mais de 44 mil leitores do nosso jornal e foi partilhada 221 vezes. “Conheço bem o quanto amigo é das pessoas, o quanto gosta de ajudar e até sofrer pelo próximo e acima de tudo a sua grande humildade”, escreveu uma leitora. Qualquer comparação com o discurso de ódio promovido pelos tais do tal partido é absolutamente desnecessária.