Apesar de as expectativas serem as de um bom ano agrícola, as temperaturas altas e a escassez de chuva nos últimos meses na região alteraram o cenário e geraram uma “situação de seca ainda mais grave” do que a de 2022. A Federação das Associações de Agricultores do Baixo Alentejo (Faaba), numa carta dirigida à ministra da tutela, exige a declaração de situação de seca e outras medidas compensatórias para o setor. Maria do Céu Antunes, no início da semana, reconheceu que a situação é “preocupante”, mas ainda esperava indicações do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) para poder agir nesse sentido.
Texto Aníbal Fernandes
Os agricultores do Baixo Alentejo querem o “reconhecimento formal da situação de seca em toda a região” para poderem ter acesso “aos instrumentos derrogatórios previstos na legislação, nomeadamente, no Plano Estratégico da Política Agrícola Comum 2023/2027”.
Esta medida permitirá “um conjunto de apoios diretos aos animais e às culturas, como forma de garantir a manutenção da atividade agrícola e evitar uma escalada nos preços dos alimentos ao consumidor”, argumentam os agricultores, que pedem ainda a antecipação das ajudas de 2023 e a “autorização de pastoreio e corte de forragem nas superfícies de interesse ecológico”, entre outras medidas.
A ministra do Mar e da Alimentação, em declarações à “CNN” no início da semana, reconheceu ser “muito preocupante a situação do País”, mas disse aguardar informações do IPMA para decretar a situação de seca. “Independentemente dessa declaração poder demorar alguns dias para poder ser emitida, o que já estamos a fazer é um conjunto de pedidos à Comissão [Europeia] para derrogar algumas obrigações dos agricultores para que possam fazer face a esta situação”, disse Maria do Céu Antunes.
Na missiva enviada à ministra do Mar e da Alimentação, a Faaba reclama também “apoios em sede fiscal (…) nomeadamente, a suspensão das contribuições à Segurança Social com o objetivo da manutenção dos postos de trabalho” e a “manutenção do preço da água do EFMA [Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva] para a presente campanha”.
Os agricultores temem que a situação se agrave e prevêem a “perda total das pastagens, forragens e cereais”, que consideram já “irreversível”. Na carta reconhecem que “as situações climáticas favoráveis no outono levaram os agricultores a realizar mais investimentos com as culturas de outono-inverno, porque se antevia uma campanha promissora, com as pastagens, forragens e cereais a terem emergências regulares e bom estado vegetativo”.
“Infelizmente, o que estamos a observar no terreno é que estas forragens e cereais ou já estão secos, ou estão a secar, levando a uma produtividade praticamente nula, tanto mais que as previsões metereológicas para os próximos 15 dias apontam para tempo quente e seco”.
A Faaba diz que “as reservas de alimentos para a pecuária são escassas ou quase nulas e a possibilidade de encontrar palha ou feno no mercado é extremamente difícil e com preços bastante altos”. Este cenário, “associado ao custo das rações, está a levar muitos agricultores a reduzir ou mesmo acabar com os seus efetivos pecuários”, lamenta.
Mas não é apenas no setor pecuário que a situação é considerada grave. Nos olivais de sequeiro era também esperado para 2023 “um ano de safra, com boa produção, mas, perante este cenário de clima adverso, tal não irá certamente acontecer em toda a região do Alentejo”, antevêem os agricultores.
O mesmo se passa no montado de sobro, onde são antecipadas “dificuldades maiores do que o ano passado, ou seja, mais um ano sem extração de cortiça, alongando o ciclo de tiragem para 11 anos, com uma quebra de rendimento significativa dos subericultores”, lê-se na carta.
RESERVAS HÍDRICAS
A situação nas bacias do Sado e do Mira é “dramática”, “com as barragens do Monte da Rocha e de Campilhas praticamente ao nível do volume morto, e a de Santa Clara já há três anos abaixo deste nível”.
A Faaba revela que a Associação de Beneficiários de Campilhas e Alto Sado se “viu obrigada a duplicar o preço da água” na presente campanha, “aos poucos agricultores que podem regar, para tentar evitar a sua falência, uma vez que a água provém exclusivamente do Alqueva”.
O mesmo se passa nas associações de beneficiários do Roxo e de Odivelas, em que os preços da água têm vindo a ser ajustados e dependem, “quase exclusivamente, da água proveniente do EFMA”.
A Faaba refere, em particular, a situação da Associação de Beneficiários do Mira (ABM) em que, para além dos problemas com a falta água, “acresce um diferendo com a tutela, de difícil resolução, entre o que são as decisões da sua direcção e da sua assembleia-geral relativas ao rateio da água e o que são as orientações do Ministério do Mar e da Alimentação”.
A federação dos agricultores está solidária com a ABM e contesta a intenção do Governo de demitir a sua direcção.
“A tutela pretende demitir a atual direção, visto que esta tenciona distribuir a água de uma forma equitativa pelos seus associados, beneficiando a maioria – decisão aprovada em assembleia-geral – e não apenas uma minoria, que viu, inclusivamente, as suas culturas serem promovidas a permanentes pela tutela. Tal como as câmaras municipais de Odemira e Aljezur, também a Faaba se solidariza e apoia as decisões tomadas pelos associados da ABM”, lê-se no comunicado.