Diário do Alentejo

“Podia chover mais, que faz falta e não faz mal”

24 de dezembro 2022 - 12:00
Chuva das últimas semanas minorou o efeito da seca, mas ainda existem albufeiras muito abaixo do normal
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As chuvas das últimas semanas vieram minorar a seca que assolava o Sul de Portugal, mas, mesmo assim, não foi suficiente para repor, significativamente, o nível de água na maioria das barragens. A exceção é a bacia hidrográfica do Guadiana, com o Alqueva a recuperar em duas semanas o volume utilizado durante o ano. Para o setor agrícola foi uma bênção e há quem peça mais chuva, “que não faz mal”.

 

Texto Aníbal Fernandes

 

Dia 19 de dezembro às 7:00 horas, a água em Alqueva atingiu a cota 148,68, a menos de quatro metros do máximo, que é 152. O volume armazenado era de 3 348,40 hectómetros cúbicos, o que correspondia a 80,66 por cento da capacidade total. Em cerca de três semanas, desde o início de dezembro, o nível da água em Alqueva subiu 4,2 metros e encaixou 763,8 hm3, ficando a 800 hm3 de atingir o pleno armazenamento.

 

A Agência Portuguesa do Ambiente, no boletim divulgado no início da semana, revelava que as albufeiras portuguesas monitorizadas pelo sistema estavam a 77 por cento da capacidade total, mas referia que no Sul do País havia vários casos onde os registos apontavam para casos de menos de 20 por cento.

 

Dessas, a grande maioria, 42, estava entre 81 e 100 por cento da capacidade, 15 estavam entre 61 e 80, e duas entre 41 e 50. Menos bem, em termos de armazenamento de água, estão 20 barragens, oito delas com uma capacidade entre os 41 e os 50, nove albufeiras entre 21 e 40, e três albufeiras abaixo dos 20 por cento.

 

Dos três casos mais graves, duas das albufeiras são no Baixo Alentejo (Campilhas, com oito por cento, e Monte da Rocha, com nove por cento), e uma no Barlavento Algarvio (Bravura, com 11 por cento). De acordo com os dados da APA, a bacia do Douro era a que registava um maior armazenamento, com mais de 90 por cento, seguida das bacias do Ave, Tejo e Vouga, todas acima da média para o mês de dezembro.

 

As bacias do Alentejo, Mira e Sado e, especialmente, a bacia do Barlavento são as que estão com valores inferiores mais longe da média. Por seu lado, a bacia do Guadiana estava perto dos 80 por cento, bastante acima da média de dezembro que é de 66,8. Ainda de acordo com a mesma fonte, nas regiões mais afetadas “foi necessário realizar em algumas barragens descargas controladas, para ganhar encaixe antes de cada um dos eventos que ocorreram em novembro e que ainda estão acontecer em dezembro”.

 

Foi o caso do Alto Lindoso (Lima), Caniçada (Cávado), Aguieira e Fronhas (Mondego), Castelo do Bode (Zêzere), e Póvoa e Meadas, na Ribeira de Nisa e Maranhão, na ribeira de Sor, ambas na bacia do Tejo.

 

REGIÃO SEM PREJUÍZOS

Ao contrário do que se passou no Norte Alentejano, a intempérie observada nas últimas semanas não causou prejuízos assinaláveis no Baixo Alentejo. Contactado pelo “Diário do Alentejo” o Comando Distrital de Operações de Beja confirmou não haver “incidentes a assinalar” durante esse período.

 

Também Claudino Matos, secretário-geral da ACOS, Agricultores do Sul não tinha conhecimento de prejuízos causados pela chuva no setor agropecuário. Para o este dirigente dos agricultores “podia recomeçar a chover já amanhã, por que ainda faz falta e não faz mal nenhum”.

 

Recorde-se que a precipitação de há duas semanas causou enormes prejuízos no Alto Alentejo, particularmente, em Campo Maior, Sousel, Monforte, Portalegre e Avis, com a destruição de infraestruturas rodoviárias, inundação de habitações e espaços urbanos e perda de efetivos pecuários. A avaliação dos valores perdidos ainda não está concluída, mas estima-se que ultrapasse, no seu conjunto, as duas dezenas de milhões de euros.

 

AMBIENTALISTAS CAUTELOSOS Francisco Ferreira, presidente da associação ambientalista Zero, diz ser cedo para fazer um balanço, referindo a existência de barragens que ainda apresentam níveis muito abaixo do normal, concretamenteno Sul do País. Francisco Ferreira chama a atenção da diferença entre seca meteorológica e seca hidrológica. Se no segundo cenário estamos perante uma “situação mais confortável” – salvaguardando o Baixo Alentejo e o Algarve -, em relação à seca meteorológica ainda estamos dependentes “do que acontecer nos próximos meses”.

 

E avisa: “O que temos verificado é que na primavera, a chuva termina mais cedo, quando antigamente tínhamos bastantes chuvadas entre o verão e o outono e depois entre a primavera e o verão e agora cada vez menos se verificam”.

 

O ambientalista alerta para a possibilidade, caso não se verifiquem as condições normais, para que a seca meteorológica possa vir a ser uma realidade “daqui a alguns meses. Temos de aproveitar esta altura que estamos a sair do período de seca para tomar as decisões certas em termos daquilo que é o curto e o longo prazo”.

 

Também o IPMA faz depender a situação do que se passar no inverno. Citada pelo “jornal i”, a meteorologista Patrícia Gomes disse que “provavelmente já podemos afastar um pouco esse cenário de seca, mas tudo depende da evolução dos próximos tempos. Neste momento, até a região sul já está ligeiramente afastada desse cenário. Agora com a continuação do inverno vamos ver”.

 

APRENDER A LIÇÃO

O presidente da Zero exorta todos a “aprender a lição”. Francisco Ferreira lembra as medidas que foram necessárias tomar no último verão e pede “uma gestão preventiva do uso da água em cada uma das albufeiras para não deixarmos chegar ao ponto em que foi mesmo preciso limitar o uso da água e com consequências também para a agricultura”.

 

Para se evitar chegar a esse ponto o ambientalista aposta no uso eficiente da água e critica a expansão de “determinado tipo de agricultura de regadio”, conclusão que é contrariada pelos agricultoresque garantem que as novas técnicas de regadio são a forma mais eficiente para o uso da água o que permite uma poupança assinalável.

 

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