Diário do Alentejo

“O voto num ou noutro candidato à CCDR é credibilizar o logro”

12 de outubro 2020 - 17:00

A frase está inscrita nesta entrevista: “Sem prejuízo do exercício do direito de voto”. Será, pois, “sem prejuízo do exercício do direito de voto”, ou seja, exercendo o direito de voto, que os autarcas eleitos pelo PCP irão ter um papel decisivo na escolha do futuro presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo.

 

Texto Marta Louro

 

As eleições estão marca- das para o próximo dia 13 de outubro. E, no caso do Alentejo, com dois candidatos à presidência: Ceia da Silva, cuja candidatura foi apresentada com o apoio dos presidentes das federações socialistas de Portalegre, Évora e do Baixo Alentejo. E Roberto Grilo, atual presidente da CCDR Alentejo, que se apresenta a votos como independente, embora sendo militante do PSD. A opção de Ceia da Silva “é um problema e uma opção de Ceia da Silva e do PS”, diz em entrevista ao “Diário do Alentejo” o responsável pela Organização Regional do Alentejo do PCP, João Dias Coelho, sublinhando que, independentemente do voto, os comunistas estão con- tra um modelo que irá “manter” as CCDR “como uma estrutura desconcentrada sobre a tutela do governo e dependente das suas decisões”.

 

Porque é que o PCP não vai apresentar candidato à CCDR Alentejo?

Desde há muito que o PCP considera que o processo em curso está inquinado. É sobeja e publicamente conhecido que ele decorre do acordo entre PS e PSD firmado no verão de 2018 e que, incluindo a transferência de encargos para as autarquias locais de áreas e serviços da competência da administração central, põe em causa a sua universalidade. Este processo concorre para a tentativa de mistificar conceitos apresentando deliberadamente a desconcentração como sinónimo de descentralização para iludir o facto de a estrutura CCDR, independentemente da eleição de um presidente e de um vice-presidente, se manter como uma estrutura desconcentrada sob a tutela do governo e dependente da suas decisões, opções e orientações estratégicas. Portanto esta farsa eleitoral e pseudo democratização das CCDR termina no exato momento do voto. Esta decisão que tem o beneplácito do Presidente da República, concorre também para adiar o cumprimento da Constituição relativo à regionalização – o pilar que falta ao poder local democrático, para um efetivo e real poder regional. Em coerência com essa avaliação, o PCP não apresenta nenhum candidato, na medida em que ao fazê-lo estaria a contribuir para legitimar um ato e um processo que se encontra inquinado.

 

Ainda assim, haverá indicação de voto nalgum candidato? 

Independentemente dos putativos candidatos em presença e sem prejuízo do exercício do direito de voto por parte dos eleitos que integram os diversos colégios eleitorais, o PCP considera que o voto num ou noutro candidato seria contribuir e credibilizar o logro e a mistificação.

 

Atualmente os presidentes das CCDR não são eleitos. Vão passar a sê-lo, ainda que de forma indireta. Não lhe parece que há um ganho no funcionamento democrático destas instituições?

Como já afirmámos, o facto [da eleição] em si mesmo não altera em nada a natureza da estrutura das CCDR, na medida em que ela não é uma autarquia, mas sim uma estrutura desconcentrada da administração central, sob o comando, as opções e orientações do governo central. 

 

Um dos candidatos, Ceia da Silva, apresentou a sua candidatura na companhia dos três presidentes das federações do PS? Que comentário lhe merece esta decisão?

É um problema e uma opção de Ceia da Silva e do PS.

 

Qual a sua opinião sobre o acordo entre António Costa e Rui Rio para “distribuir” as presidências das CCDR?

Apenas confirma que o logro e mistificação da designada “demo- cratização” serve para adiar mais uma vez a regionalização e que PS e PSD, a que se pode acrescentar o CDS, concorrem entre si para distribuir lugares, porque ambos estão de acordo com o essencial… ou seja, adiar a regionalização, fingindo mudar alguma coisa para que tudo fique na mesma.

 

Não apresentando um candidato, quais devem ser as prioridades do próximo presidente da CCDR?

A região precisa é de um efetivo poder regional, capaz de não só fazer diagnósticos, mas dotado dos meios e autonomia política, administrativa e financeira. O próximo presidente deve olhar para o território que é um terço do todo nacional, para as suas capacidades endógenas e estabelecer um verdadeiro plano de desenvolvimento regional. Contudo, queremos salientar que independentemente de quem vier a ser eleito é necessário que os critérios de distribuição dos meios financeiros do Estado, ou os oriundos dos fundos comunitários, não sejam governamentalizados, não sirvam como arma de arremesso, nem de instrumento para fins eleitoralistas. Aos eleitos no poder local, aos agentes económicos e culturais da região, está colocada a exigência do prosseguimento do esforço em prol das populações e da exigência junto de todas as entidades da necessidade de serem assegurados e não desviados os fundos comunitários indispensáveis ao investimento na região. Está também colocada a exigência da elaboração de um Plano de Apoio à Base Económica e de um programa de infraestruturas públicas para o Alentejo, considerando como áreas nucleares os recursos hídricos, a mobilidade, a saúde, a energia, as conetividades, o aco- lhimento empresarial e aposta na base económica regional condi- ções inseparáveis para um desenvolvimento sustentável e a criação de emprego com direitos.

 

Acredita que haverá condições para avançar com a regionalização nos próximos anos?

Pela parte do PCP, este preceito constitucional deverá ser cumprido. Aliás, os alentejanos já demonstraram que querem a regionalização. Aos que agora se afirmam defensores da regionalização, fica o desafio de unirem esforços para desmentirem a tese que tal passo significaria mais gastos, mais cargos e divisão do País e contribuírem para que se avance de facto com uma verdadeira e democrática descentralização a nível regional.

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