Diário do Alentejo

Maria Ana Ameixa: “No romance vivo a liberdade total”

01 de março 2021 - 10:00

Maria Ana Ameixa tem 53 anos, é natural de Ferreira do Alentejo, vila onde cresceu e reside, vila que tem servido de mote a grande parte da sua safra literária. É licenciada em Biologia pela Universidade de Coimbra, e desempenha a profissão de professora na Escola Secundária de Diogo de Gouveia, em Beja.

 

A sua aventura no mundo da escrita criativa começou em 2009. Uma aventura que já dura há mais de uma década, uma aventura preenchida por sete romances editados, dois contos publicados em obras coletivas promovidas pela ASSESTA – Associação de Escritores do Alentejo, várias peças de teatro escritas e encenadas, um argumento para uma radionovela e outro para uma série radiofónica.

 

Na sua bibliografia destacam-se os romances “Aconteceu…na Rua da Ladeira” (2013), “Uma Aventura Rumo ao Céu” (2014) e “Aconteceu… na Igreja do Espírito Santo” (2016), editados pela Lugar da Palavra, e “Compromisso de Risco” (2018), editado pelo Grupo narrativa.

 

Quando e como foi descoberta a vocação para a literatura?

O início da escrita foi impulsionado pelos alunos, no final do ano letivo 2008/2009. Por considerar a leitura um valor inestimável, sempre incentivei os alunos a lerem e aprecio refletir com eles sobre as histórias lidas. Foi surpreendente o momento em que os papéis se inverteram e acabo por ser incentivada pelos alunos a passar para o papel as minhas ideias. “Professora, devia escrever! A professora tem jeito para isso”. Foram palavras que mudaram a minha vida. Surge o primeiro de vários romances, escrito entre 16 de junho e 4 de setembro de 2009, intitulado “Do profano ao sagrado I – a aventura da descoberta”.

 

Dos vários registos literários, algum que seja o de eleição?

O romance, porque não tem limites. No conto ou no teatro sinto-me condicionada por diversos fatores. Os contos que criei tiveram limitação no número de páginas. No teatro tenho sempre de considerar o número de atores de que disponho para criar as peças. No romance vivo a liberdade total. Numa primeira fase agradava-me que as personagens obedecessem ao enredo imaginado na minha cabeça, mas no presente sou conduzida pelas histórias e suas personagens, e o prazer é ainda maior.

 

Viver no Alentejo é fonte de inspiração ou de limitações para a carreira de escritora?

Viver no Alentejo é excelente como fonte de inspiração. As pessoas, a paisagem, os cheiros, as cores, as estações do ano a marcarem as suas diferenças na paisagem, tudo me serve de inspiração. Carreira de escritora! Como não estou na escrita para fazer carreira, mas tão-somente para partilhar algumas ideias, não sinto qualquer limitação por viver no Alentejo.

 

Peço-lhe que destaque alguns dos trabalhos desenvolvidos ao longo do percurso literário; alguns que tenham sido mais marcantes?

Os dois romances históricos, a peça de teatro “A Sentença” e a radionovela “Menorah”. O “Aconteceu…na Rua da Ladeira” é um romance histórico baseado em factos relatados pelo meu pai e em ocorrências familiares. A intensidade emocional, ao elaborar essa história, foi muito profunda. Quando coloquei o último ponto final, a libertação das emoções levou-me às lágrimas. O “Aconteceu…na Igreja do Espírito Santo” tornou-se muito importante porque me obrigou a pesquisar dados de uma página escura da história de Ferreira do Alentejo: o tempo da Inquisição. A peça “A Sentença” foi o primeiro monólogo que escrevi e tem uma mensagem fortíssima que me marcou consideravelmente. Olhar as diversas faces da personalidade de uma mulher rotulada de louca foi um desafio incomparável. Por nunca ter imaginado que escreveria uma radionovela, a sua criação também foi um momento marcante.

 

E há também momentos inusitados ao longo do percurso artístico?

Os momentos mais caricatos estão associados ao processo de encenação das peças de teatro. O ato de encontrar personagens, os lapsos nos ensaios, a criatividade dos atores depois de vestirem a pele das suas personagens. Nesse universo há inúmeras histórias. Todavia, partilho que durante a apresentação da radionovela houve quem admitisse a possibilidade de me subornar para saber como terminaria a história. É claro que a situação foi de diversão, mas eu não esperava que ao ir fazer um exame médico me deparasse com uma sugestão dessa natureza, proveniente das técnicas do laboratório. 

 

As novas tecnologias representam, no seu caso, uma mais-valia ou um constrangimento para a literatura?

Se as publicações em ‘e-book’ aumentarem o número de leitores no nosso país, então serei a primeira a considerar o formato como uma mais-valia. Pessoalmente, não dispenso uma publicação em livro, preciso de o sentir e de o cheirar.

 

Qual a sua opinião sobre o universo literário em Portugal?

No universo literário português é preciso considerar diferentes grupos de escritores: aqueles que fazem da escrita a sua razão de viver e produzem trabalhos extraordinários; aqueles que escrevem à procura de protagonismo e facilmente publicam os seus trabalhos, sem que as editoras façam um trabalho sério de revisão; e outros que fazem um trabalho de qualidade, sem protagonismos e por vezes sendo vítimas de editoras não aconselháveis.

 

E sobre o acordo ortográfico?

Não me agradou o acordo ortográfico estabelecido, mas penso que as sucessivas polémicas em torno do tema foram desgastantes e pouco edificantes.

 

Como tem sido vivido este período de “stand by” no mundo?

Estou a escrever, ato que não deixei desde 2009. No final de 2020, por ocasião da festa de Nossa Senhora da Conceição, escrevi uma pequena série radiofónica. Em 2020 foi publicado em ‘e-book’ o meu último romance “Compromisso de Risco”. 

 

O que está na “manga” da escritora Maria Ana Ameixa a curto e médio prazo?

Tenho um novo romance que tenciono publicar no primeiro semestre deste ano. Relativamente aos trabalhos teatrais, digo apenas que em breve surgirá uma novidade.

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