Diário do Alentejo

“O Alentejo é, para mim, sinónimo de solidão”

11 de dezembro 2020 - 17:55

A vencedora do Prémio Literário Joaquim Mestre 2020 é Maria Luísa Santos, autora de "Eu Solidão", o livro premiado. Um romance cujo cenário é o Alentejo, nomeadamente as cidades de Évora e Beja.

 

Texto José Serrano

 

Instituído em 2017 pela Assesta – Associação de Escritores do Alentejo, em parceria com a Direção Regional de Cultura do Alentejo e com o apoio do Município de Beja ,o Prémio Literário Joaquim Mestre foi atribuído este ano a Maria Luísa Santos, autora de "Eu Solidão".

 

Um reconhecimento que a escritora acolheu como uma agradável surpresa: “Quando se concorre a um qualquer prémio a esperança de ganhar está sempre presente. Tinha gostado do que escrevi, mas isso não era sinónimo de prémio porque há muitas variáveis em jogo. O gosto do júri, a qualidade dos trabalhos dos outros concorrentes, a subjetividade que pressupõe qualquer tipo de avaliação. A chamada telefónica que me comunicou o prémio ficará sempre registada na minha memória. Foi o reconhecimento de um trabalho que me foi muito agradável de escrever”, sublinha.

 

Neste romance – “fundamentalmente, uma obra de amargura, de alguém que abandonou a casa dos pais e a sociedade e se transformou numa pessoa amarga, solitária, desesperada pela felicidade” – Ofélia, a protagonista, deambula na história entre as cidades de Beja e Évora.

 

O Alentejo, cenário da história, que a escritora se lembra desde criança, quando o atravessava a caminho das férias no Algarve: “Tinha a ideia de uma região árida que ansiávamos ultrapassar por causa do calor. Não havia ar condicionado, encontrávamos poucos locais para nos refrescarmos com uma bebida fresca, era uma nunca acabar de estrada sempre plana”.

 

O Alentejo, revisitado depois como exercício documental necessário para a elaboração desta obra: “Quando tive vontade de escrever o romance fui passar oito dias ao Alentejo. Percorri todas as aldeias e vilas que são mencionadas no livro, e pernoitei em Évora e Beja. Muitas vezes me perguntei onde estavam as pessoas. Entrávamos e saiamos das aldeias e vilas quase sem ver ninguém, com as casas de janelas fechadas como se não fossem habitadas. O Alentejo tem uma espécie de mistério e calma que me serena mas que, ao mesmo tempo, me assusta. A solidão absorve-nos o pensamento e parece querer isolar-nos. Penso que assimilei e trouxe um pouco do Alentejo para casa”.

 

A viagem empreendida na região, pela autora, terá mesmo influenciado o rumo desta história, as decisões e o destino da protagonista: “O Alentejo é, para mim, sinónimo de solidão, de gente espalhada pelos campos, pelas ruas desertas. Ofélia sente esse isolamento, a solidão de alguém que não tem família, que vive da boa vontade das pessoas que nem sequer são seus amigos porque está deslocada do seu ambiente. As suas decisões derivam da falta de identificação com a sua casa em Beja, da perda do casal que considerava avós, da necessidade de se afastar de um local que passou a ser-lhe adverso”.

 

Maria Luísa Santos – natural de Vila Nova de Gaia, professora aposentada, licenciada em História, mestre em Administração Escolar e doutorada em Ciência da Educação – dedica-se atualmente à pintura e, principalmente, à escrita. Autora de vários livros – romance, poesia, contos, infanto-juvenis – refere a satisfação sentida pelo reconhecimento do seu trabalho, que funciona como “mais um incentivo à escrita, à criação de histórias que espero possam preencher, de forma agradável, algum tempo dos leitores”.

 

BALANÇO POSITIVO

O presidente da Assesta, Luís Miguel Ricardo, faz um balanço bastante positivo desta segunda edição do prémio – em que o “Romance” passou a ser o género narrativo exclusivo, suprimindo-se o “Conto” –, afirmando-se de dimensão nacional, ao atrair “concorrentes de todo o país”. Porém, elucida, tal concretização “não significa acomodação”, considerando este responsável da associação literária que existe um longo caminho a percorrer “para que o prémio transite de dimensão para referência nacional”.

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