Diário do Alentejo

Empresários dizem que projeto da EDIA “não implicará paragem”

23 de julho 2021 - 12:00

Chamam-se Unidades de Recirculação de Subprodutos de Alqueva, foram candidatas pela Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas de Alqueva (EDIA) no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência e visam, através do sistema de compostagem, transformar subprodutos agrícolas e agroindustriais (como o bagaço de azeitona) em fertilizantes orgânicos. “Todo o bagaço que vai para as fábricas não volta para o território (…) quando se acabar o bagaço, acabam-se as fábricas”, disse ao “DA” o responsável da EDIA pelo projeto, David Catita.

 

Texto Luís Godinho e Marta Louro

 

Sem a matéria-prima com que laboram, fábricas como a das Fortes ou a de Alvito podem ter os dias contados. Mas António Brito, presidente da União de Cooperativas do Sul (Ucasul), proprietária da fábrica de Alvito, garante que o projeto da EDIA “não irá ter impacto no dia a dia” daquela unidade industrial. “Os volumes que recebemos e laboramos são muito superiores aos que acreditamos que o projeto da EDIA conseguirá realizar, por impossibilidade técnica, económica e principalmente logística”. Por outro lado, mesmo que as unidades de recirculação venham a ser uma realidade, “tal não implicará a paragem da laboração”, acrescenta António Brito, recordando a expansão da área de olival no perímetro de Alqueva e o aumento de produção de azeite: “Estamos neste momento a aumentar a capacidade de secagem para poder dar resposta às produções dos próximos anos evitando assim o colapso do setor olivícola da nossa região”.

 

O presidente da Ucasul garante que a empresa “apoia todas as entidades e iniciativas que promovam a resolução dos problemas ambientais dos lagares de azeite na região onde está inserida”, mas diz-se convencido que as unidades de recirculação de subprodutos “não serão uma mais-valia” para as populações pois “o armazenamento de grandes volumes de matéria orgânica e posterior fermentação irá libertar obrigatoriamente cheiros intensos”.

 

“Pensamos que o projeto mais viável para a resolução deste problema passa pela redução do tempo de permanência dos bagaços em armazenamento. Isto só se consegue com um aumento da capacidade em secagem dos mesmos. Esta secagem deverá também ser acompanhada de filtros electroestáticos de partículas”, prossegue António Brito, segundo o qual a unidade fabril de Alvito está a “iniciar uma revolução tecnológica” com a aquisição de novos equipamentos, prevendo-se para fevereiro do próximo ano a “entrada em funcionamento do primeiro filtro electroestático de partículas, o primeiro neste setor, a nível nacional”. “Com a instalação deste tipo de filtro”, refere, “irão desaparecer as queixas que as populações normalmente apresentam. Será um investimento que ronda os cinco milhões de euros, mas que serão bem empregues, pois irá aumentar a capacidade produtiva da Ucasul e concretiza a ambição das cooperativas associadas na redução quase total dos fumos e cheiros característicos desta atividade”.

 

“AS PESSOAS ESTÃO A SOFRER”

 

Para João Paulo Martins, da associação ambientalista Zero, o projeto da EDIA representa um passo “positivo” no sentido em que “se limitarão os problemas que existem no ar, ao nosso redor”, seja em Fortes, no concelho de Ferreira do Alentejo, ou em Alvito. “Conheço a situação de Fortes. É algo que tem de ser resolvido, porque as pessoas estão a sofrer. Não falamos só em condições de saúde, mas também, na qualidade de vida em geral. Não é pelo facto de não ser uma grande povoação, que não devemos, também, dar o devido valor aos habitantes daquela área”.

 

Segundo João Paulo Martins, a compostagem do bagaço de azeitona permitirá não só “limitar os problemas associados à poluição”, como também “produzir composto [fertilizante] para introduzir no solo”, isto numa região em que os terrenos “precisam imenso de matéria orgânica”.

 

Ainda assim, o responsável da Zero diz que “a grande questão é saber como é que operacionaliza” o projeto, designadamente a nível da viabilização económicas e do transporte do bagaço de azeitona. “Existe um serie de questões que precisam de ser debatidas e esclarecidas. E é importante, também, perceber de que modo o Estado e as autarquias podem intervir”.

 

Deputado do PS e presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura e do Mar, Pedro do Carmo entende que a criação destas unidades “pode ser uma solução para o bagaço de azeitona e para alimentar os nossos solos”, porque a situação, como está, “é que não pode continuar”. No entanto, adverte, “é preciso “melhorar o processo técnico das fábricas e olhar para os países que já passaram por este processo”.

 

Já o deputado do PCP, João Dias, diz “não acreditar que a compostagem resolva por inteiro o problema”. Para isso, sublinha, “é preciso que os processos da purificação do ar e da água provenientes das fábricas sejam cada vez mais rigorosos e escrutinados”.

 

Ouvido em 2019 na Comissão Parlamentar do Ambiente, o então vice-presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Alentejo, Jorge Pulido Valente, explicou que os problemas se agravaram pois “as unidades de secagem de bagaço de azeitona intensificaram a sua capacidade de produção porque existe mais produção de azeitona e de azeite. Na secagem do bagaço utiliza-se como combustível, o próprio bagaço de azeitona seco, e, portanto, existe um conjunto de emissões que decorrem do processo industrial e que, depois, originam a emissão destes odores e fumos”.

 

Na altura, Pulido Valente chamou a atenção para a distinção entre “entre aquilo que é um incómodo e o que é um prejuízo”. E explicou: “mesmo havendo cumprimento dos valores do limite de emissão, estas emissões causam incómodo se as populações se situarem ao lado das fábricas”. Para o resolver apontou dois caminhos: “[Colocação de] filtros electroestáticos, que já estão a ser testados em Espanha ou a deslocalização destas unidades de forma a que possam funcionar com estas emissões, mas que não estejam ao lado das povoações”.

 

UNIDADES CUSTAM ENTRE 100 E 500 MIL EUROS

 

As unidades particulares necessitam de um investimento entre 100 e 200 mil euros e são passíveis de ser apoiados financeiramente em cerca de 45 por cento. Já as unidades a criar pela EDIA custarão à volta de 500 mil euros. A diferença no investimento justifica-se com o facto das empresas já a laborar terem, em parte, maquinaria que pode ser utilizada no processo. As empresas Olivimundo e a Rabadoa já formalizaram os respetivos pedidos de licenciamento junto da Câmara de Beja.

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