Diário do Alentejo

Algarvios querem ligação ferroviária a Beja

15 de abril 2021 - 12:25

O Movimento Mais Ferrovia (MMF) defende que a construção de uma estratégia para a ferrovia do Algarve tem de incluir a ligação ao aeroporto de Beja.

 

Texto Marta Louro

 

Entre as propostas deste movimento algarvio está a “construção de uma linha de alta velocidade paralela à Via do Infante (A22), que faça a ligação ao Alentejo, servindo o aeroporto de Beja, Lisboa/Porto e a Andaluzia, com o atravessamento do Rio Guadiana". Em declarações ao “DA, a porta-voz do MMF, Cristina Grilo, diz tratarem-se de propostas que irão beneficiar as duas regiões. “O sul do país tem um imenso potencial de desenvolvimento no seu território, não só turístico, como noutros setores, como o agrícola e os ligados ao mar (pois o Alentejo também tem uma extensa orla costeira). O Algarve e o Alentejo poderão fortalecer, através da ferrovia, a sua ligação a Espanha e à Europa. E, através desta ligação, poderá Portugal fazer parte do corredor ferroviário do Mediterrâneo que atravessa Espanha, França, Itália, Eslovénia, Croácia e Hungria”.

 

Segundo Cristina Grilo, a ligação ferroviária do Algarve ao aeroporto de Beja é uma “mais-valia” e, por isso, deve figurar na estratégia para a ferrovia: “O Alentejo, o Algarve e a Andaluzia são três regiões dotadas de infraestruturas aeroportuárias, mas também portuárias, cuja ligação por ferrovia se poderia potenciar, com todos os benefícios decorrentes para as respetivas regiões/países, especialmente para o inaproveitado aeroporto de Beja”. Dito de outra forma: “Estando estas regiões dotadas de infraestruturas aeroportuárias e portuárias, poderá fechar-se um profícuo ciclo de ligação das interfaces ferroviária, aeroportuária e portuária, neste caso, se pensarmos essencialmente no transporte de mercadorias”.

 

Para que isso aconteça, o MMF defende que é necessário existir “ambição e empenho das duas regiões – Alentejo e Algarve – e sobretudo dos autarcas, empresários e outros grupos de cidadãos, para que haja um estreitamento das relações e ligações com a Andaluzia”. É importante, também, “que os decisores políticos e do planeamento e desenvolvimento regionais, conjuntamente, o saibam reclamar junto do Governo” e que exista “vontade política dos governos português e espanhol”.

 

Para Cristina Grilo, “se o Alentejo e o Algarve aspiram a um desenvolvimento equilibrado e sustentável, que os coloque ao mesmo nível de outras regiões, deverão ambicionar e empenhar-se, conjuntamente com a Andaluzia, na concretização desta ligação”. Por outro lado, o Governo precisa de valorizar mais as regiões do interior do sul, “tendo em consideração o seu imenso potencial em termos territoriais”.

 

APOSTA ESTRUTURAL

 

Investigador da Universidade do Algarve e especialista em transportes ferroviários, Manuel Tão refere ao “DA”, que a “questão da ferrovia relativamente ao Alentejo e a Beja é qualquer coisa que é estrutural, não apenas em termos de ordenamento do território”, como também, a “nível técnico e da própria operacionalidade da ferrovia como rede”. Atualmente, lembra Manuel Tão, “estamos ligados da área metropolitana de Lisboa ao Algarve através da antiga Linha do Sado, hoje chamada Linha do Sul, que não tem capacidade e que está condicionada pelo movimento crescente de contentores” a partir do porto de Sines. “É imperioso que exista uma segunda linha entre Lisboa e o Algarve. Se essa linha passar através do aeroporto de Beja melhor ainda, porque é uma infraestrutura aeroportuária com área de influência que se projeta a norte até ao Pinhal Novo, no distrito de Setúbal, e que depois se projeta para sul em direção ao Algarve”.

 

Segundo o investigador da Universidade do Algarve e especialista em transportes ferroviários, “a Linha do Alentejo tem características de geometria de traçado muito favoráveis: com a sua eletrificação podemos facilmente colocar a funcionar comboios que atinjam a 200 a 220 quilómetros horários”.

 

A eletrificação da linha e a operacionalização do aeroporto de Beja é algo fundamental para ambas as regiões. “O aeroporto de Beja tem características tais, que permitem uma operacionalidade de 365 dias por ano e 24 horas por dia, assim como a sua capacidade demora muito tempo a esgotar. Beja tem capacidade para receber dos maiores aviões do mundo, algo que não acontece em Lisboa”, lembra.

 

Manuel Tão entende que deve ser estudada uma articulação de Lisboa com Beja (a sul) e com Monte Real (a norte), não só para “distribuir as cargas que atendem ao aeroporto da Portela” como também para centrar na capital as chamadas “companhia de bandeira”, reafetando a outros aeroportos os voos de baixo custo. “Nem sequer é Beja a grande beneficiária do aeroporto de Beja, ligado por ferrovia a norte e a sul. Os grandes beneficiários são a Península de Setúbal, a área metropolitana de Lisboa, o Algarve, a costa alentejana e a Extremadura espanhola. A capital do Baixo Alentejo vai beneficiar em segunda linha da expansão da área de influência do aeroporto de Beja através da rede ferroviária”, remata Manuel Tão.

 

“Aeroporto de Beja não é um erro do passado”

 

O presidente executivo da Associação dos Transitários de Portugal (APAT), António Nabo Martins, recorda que o Aeroporto de Beja “tem infraestruturas suficientes e capazes para, por exemplo, para funcionar como um ‘hub’ de carga entre dois continentes, nomeadamente entre o continente asiático e a América” e que “poderia ser eleito como uma plataforma ‘hub’ para essas cargas que atravessam continentes”. Num fórum organizado em março pela revista “Cargo”, António Nabo Martins acrescentou que esta infraestrutura por ser “uma plataforma importante para fazer crescer [os transportes de carga] através de Sines”, numa fase, pós-pandemia, que será marcada pela expansão das vendas online. “O Aeroporto de Beja não é um erro do passado […] cria grandes vantagens competitivas para o complexo portuário, industrial e logístico de Sines. Os maiores aviões podem aterrar em Beja e há, obviamente, uma sinergia. Possui terminais, nomeadamente o terminal de carga aeroportuária – gerido pela Vinci – e temos trabalhado em conjunto na promoção do conceito Sines – ‘hub’ logístico”, referiu, por sua vez, Filipe Costa, diretor executivo da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (Aicep).

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